sexta-feira, 6 de novembro de 2009

HOMEM COMUM

"Sou um homem comum
de carne e de memória, de osso e esquecimento.
E a vida sopra dentro de mim pânica
Feito a chama de um maçarico
E pode subitamente cessar.
Sou como você, feito de coisas lembradas e esquecidas
Rostos e mãos, o quarda-sol vermelho ao meio-dia
Defuntas alegrias, flores, passarinhos
Facho de tarde luminosa, nomes que já nem sei
Bandejas, bandeiras, bananeiras, tudo misturado
Essa lenha perfumada que se acende e me faz caminhar
Sou um homem comum brasileiro, maior, casado, reservista,
E não vejo na vida, amigo, nenhum sentido,
Senão lutarmos juntos por um mundo melhor.
Poeta fui de rápido destino.
Mas a poesia é rara e não comove nem move o pau-de-arara.
Quero, por isso, falar com você, de homem para homem,
Apoiar-me em você, oferecer-lhe o meu braço
Que o tempo é pouco e o latifúndio está aí, matando.
Homem comum, igual a você,
Cruzo a avenida sob a pressão do imperialismo.
A sombra do latifúndio mancha a paisagem,
Turva as águas do mar e a infância
Nos volta à boca, amarga, suja de lama e de fome.
Mas somos muitos milhões de homens comuns
E podemos formar uma muralha
Com nossos corpos de sonho e margaridas..."
(Ferreira Gullar)

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