terça-feira, 15 de abril de 2008

MOMENTOS DE SILÊNCIO

"Há momentos em que a Vida silencia,
obrigando-me a ouvir a voz interior.
Tento escapar e busco o Vento,
mas ele apenas sopra sem um ruído sequer.
Corro para o Mar, implorando por um rugir das ondas,
mas ele se faz inquietante calmaria.
Na rua vazia, os carros não passam.
Na praça florida há um êxodo de crianças.
Os cães não latem, os gatos não miam, os pombos não arrulham.
Há momentos em que o exterior se cala em agonia.
Quieta, acomodo-me num canto da sala
e deixo-me escorregar pelo tapete macio.
Pensamentos dançam um balé elaborado que calmamente observo.
Lembranças desenham na mente
traços desordenados e formas desconexas.
Nem uma palavra encontra força para irromper pela garganta.
Pouco a pouco, tudo se apaga e a ânsia se esvazia.
Com os olhos fechados, tateio meus sonhos
esquecidos no tempo e encontro-os ainda lá.
Intactos. Íntegros. Inteiros. Ainda sonhos.
Há momentos em que a Vida silencia
para que eu resgate meus sonhos do Esquecimento.
Levanto-me devagar e ando até a janela.
Nenhum sinal de sonoridade aparente.
Nenhuma paisagem nova.
Nem um chamado pra contar a história.
Um a um, meus sonhos saem do sono, despertos e renovados.
Pressinto um sorriso arriscando a esboçar-se no meu rosto
e a alegria invadindo cada músculo da face,
num alongamento prolongado que também calmamente observo.
Saio lentamente desse torpor momentaneo
e retomo contato com o ambiente.
Quanto tempo estive ausente?
Um cheiro negro de fumaça me irrita a garganta.
Passo as mãos sobre os olhos e vejo os onibus
passando na rua entre as calçadas cheias de gente.
Escuto a gritaria alegre das crianças na praça
e o estrondo das ondas quebrando na praia.
Buzinas mal educadas, o pio do Bem-Te-Vi,
o rádio na Paradiso, um martelar intermitente...
é, voltei ao mundo real.
Ao pesadelo tronitoante de cada dia,
ao som dessa orquestra infernal.
Ainda resta o sonho, esperando pra ser vivido,
porque -Existe um lugar...-"
(Denise Rangel)

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