sábado, 31 de outubro de 2009

DESISTÊNCIA...

"Ela merecia um homem melhor...
Um que a soubesse de cor.
Um que a tivesse na ponta dos dedos,
que lhe soubesse um a um os segredos.
Um homem que fizesse sumir o medo da madrugada.
Um homem que a fizesse sorrir ao fim do dia,
mesmo suja e cansada.
Ela merecia um pouco mais de sorte.
Um homem sensível e forte.
Alguém que a amasse, simplesmente.
Que surgisse em seu trabalho, de repente,
no meio de uma tarde preguiçosa,
com um beijo nas mãos e um ramalhete de rosas.
Ela merecia algo de mágica, eu sei...
Uma quase princesa à espera de um rei.
Ela,e todas as mulheres dentro dela,
mereciam cada uma seu par ideal...
Mas ontem à tarde, no centro da cidade,
o salto no espaço e o ponto final..."
(Moacir Caetano)

CHOVE DENTRO DE MIM...

"Ei, eu já te disse isso...
É que chove dentro de mim...
Chove dentro de mim!
Chove assim, essa chuva fininha,
chuva de molhar bobo.
Chove e não para nunca,
chuva que desce o morro
inundando as plantações de dentro de mim.
Chuva que insiste, insiste,
chuva que não tem fim.
Mas enfim, não pense que eu sou triste.
Meu céu é azul, aberto
e o sol está quase sempre por perto.
E a noite é quase sempre pequena
(pois a minha alma não).
E é sempre esse mesmo dilema
entre a luz e a solidão.
Fico com os dois.
É meu feijão com arroz.
E sigo, completamente molhado
pelos carros que passam ao lado.
É, vai ser sempre assim.
Pois chove dentro de mim..."
(Moacir Caetano)

A CALMA

"Um dia fui criança...eu me lembro!
E tudo era dança e desprendimento.
E tudo era ser feliz ao sabor de cada momento.
E tudo era bolacha, e café com leite,
e desenho animado, e meu avô do meu lado.
Mas meus ossos, minhas células,
minhas glândulas e artérias,
meu corpo todo, traidor, cresceu.
E com ele a dor.
Um dia fui adolescente, me lembro muito bem.
E sabia tudo sobre tudo,
sabia sem perguntar a ninguém.
E todo o mundo era minha estrada.
A vida, uma motocicleta envenenada.
E no entanto, colidi com meu próprio espanto.
E esqueci-me de cintos de segurança.
E matei minha esperança.
Um dia envelheci, eu me lembro.
Há algum tempo atrás.
E a poesia chegou um pouco tarde demais,
quando já era gelo dentro de mim...
Quando já não havia montanhas-russas ou viagens à lua.
Quando cheguei enfim ao outro lado da rua
sem ninguém pra segurar minha mão...
E o que era independência se tornou em somente solidão.
E há o hoje. Eu me lembro.
E esse movimento...
Um rio me correndo por dentro..."
(Moacir Caetano)

DESCONFORTO

"Acordou de manhã e calçou seu destino.
Achou-o um pouco apertado,
mas ainda assim seguiu seu caminho.
Durante o dia, a dor aumentou.
Doía no carro, dóia na rua, doía no elevador.
Parou na calçada e chorou.
Não sabia o que fazer.
Não sabia como se salvaria dessa teia.
Só não pensou no mais simples:
tirar os sapatos e andar com os pés na areia..."
(Moacir Caetano)

PERGUNTAS...

"E que que importância tenho eu
no tribunal do esquecimento?
Como se chama a flor que voa
de pássaro em pássaro?
Que significa persistir
chegado o beco da morte?
E que devo dizer aos cravos
agradecendo-lhes o perfume?
Em que janela fiquei olhando
o tempo sepultado?
Posso perguntar ao meu livro
se é verdade que o escrevi?"
(Pablo Neruda)

COISAS QUE ME LEVAM A TI...

"De montanhas e barcas nada sei.
Mas sei a trajetória de uma altura
E certa fundura de águas
E há de me levar a ti uma das duas.
De ares e asas não percebo nada.
Mas atravesso abismos e um vazio de avessos
Para tocar a luz do teu começo.
Das pedras só conheço as ágatas.
Mas arranco do xisto as esmeraldas
Se me disseres que é verde a dádiva
Que responde as perguntas da Ilusão.
E posso me ferir no gelo das espadas
Se me quiseres banhada de vermelho..."
(Hilda Hilst)

A PEQUENA PRAÇA

"A minha vida tinha tomado a forma da pequena praça
Naquele outono em que a tua morte se organizava meticulosamente
Eu agarrava-me à praça porque tu amavas
A humanidade humilde e nostálgica das pequenas lojas
Onde os caixeiros dobram e desdobram fitas e fazendas
Eu procurava tornar-me tu porque tu ias morrer
E a vida toda deixava ali de ser a minha
Eu procurava sorrir como tu sorrias
Ao vendedor de jornais ao vendedor de tabaco
E à mulher sem pernas que vendia violetas
Eu pedia à mulher sem pernas que rezasse por ti
Eu acendia velas em todos os altares
Das igrejas que ficam no canto desta praça
Pois mal abri os olhos e vi foi para ler
A vocação do eterno escrita no teu rosto
Eu convocava as ruas os lugares as gentes
Que foram testemunhas do teu rosto
Para que eles te chamassem para que eles desfizessem
O tecido que a morte entrelaçava em ti..."
(Sophia de Mello Breyner)

ACONTECE QUE...

"Acontece que me canso de meus pés
e de minhas unhas, do meu cabelo
e até da minha sombra.
Acontece que me canso de ser homem.
Todavia, seria delicioso
assustar um notário com um lírio cortado
ou matar uma freira com um soco na orelha.
Seria belo ir pelas ruas com uma faca verde
e aos gritos até morrer de frio.
Passeio calmamente, com olhos, com sapatos,
com fúria e esquecimento,
passo, atravesso escritórios e lojas ortopédicas,
e pátios onde há roupa pendurada num arame:
cuecas, toalhas e camisas
que choram lentas lágrimas sórdidas..."
(Pablo Neruda)

ANTES DE AMAR-TE...

"Antes de amar-te, amor, nada era meu
Vacilei pelas ruas e as coisas:
Nada contava nem tinha nome:
O mundo era do ar que esperava.
E conheci salões cinzentos,
Túneis habitados pela lua,
Hangares cruéis que se despediam,
Perguntas que insistiam na areia.
Tudo estava vazio, morto e mudo,
Caído, abandonado e decaído,
Tudo era inalienavelmente alheio,
Tudo era dos outros e de ninguém,
Até que tua beleza e tua pobreza
De dádivas encheram o outono."
(Pablo Neruda)

RECORDO AINDA...

"Recordo ainda...
e nada mais me importa.
Aqueles dias de uma luz tão mansa
Que me deixavam, sempre, de lembrança,
Algum brinquedo novo à minha porta...
Mas veio um vento de desesperança
Soprando cinzas pela noite morta!
E eu pendurei na galharia torta
Todos os meus brinquedos de criança...
Estrada afora após segui...
Mas, aí,
Embora idade e senso eu aparente
Não vos iludais o velho que aqui vai:
Eu quero os meus brinquedos novamente!
Sou um pobre menino... acreditai!...
Que envelheceu, um dia, de repente..."
(Mario Quintana)

IDÍLIO

"Entre notícias antigas e muralhas
construí com você
um amor feito alucinadamente de palavras.
Meus versos seduzem os seus
seus versos aliciam os meus.
Coloquei nossos livros juntos na estante
para que se toquem
e se amem clandestinamente
durante as madrugadas..."
(Iracema Macedo)

TEU RETRATO...

"Teu retrato não é imagem.
teu retrato é cheiro e som,
gesto de mãos,
avesso de palavras esquecidas.
um olhar enviesado sobre as coisas,
desdém e desamparo.
teu retrato vai além, me provoca.
é retrátil, teu retrato.
me pergunto: quando e onde?
resposta: barulhinho de chuva.
em minha precariedade
teu retrato arranha e grita,
sem caber-me.
Impreciso, teu retrato não dorme mais.
em mim, aceso, assim..."
(Marcia Cardeal)

OS HOMENS E AS COISAS

"Os homens são homens
as coisas são coisas.
Os homens valem menos que as coisas
para os homens.
Para as coisas
os homens valem mais
pois sem os homens
não seriam coisas.
Os homens vivem
para ter todas as coisas,
e no final da vida dos homens
as coisas continuam sem dono.
Os homens morrem por todas as coisas,
e as coisas continuam lá,
só coisas..."
(Ariel Cardeal)

EU PRECISO...

"Eu preciso de um lugar impreciso
Onde não caiba nada
Caiba de tudo um pouco, menos de juízo.
Um lugar menos chão
Onde meus pés alcancem acima
Abaixo o universo além da mão
Um lugar onde não saiba o nome das ruas
Anônimos me olhando na avenida
Formigueiro humano embaixo do travesseiro
Eu preciso de um lugar que caiba em mim
Onde não caibo mais.
Eu preciso..."
(Marcia Cardeal)

NA ARRUMAÇÃO DO TERRAÇO

"Tudo passou,
os copos estão quebrados e os pratos repletos de vazio.
As cinzas cintilam o chão de dor
nas costas e de segunda-feira.
Tudo passou,
as bocas estão amargas, os olhos fatigados
e os estômagos, incompreensivos,
rebelam-se contra os delírios incessantes do ontem convulso.
Passou, tudo,
as moças e os rapazes vão reerguer a manhã
de cálculos e cronômetros,
sem poder dar a ela sequer uma brasa da noite.
Passou,
a rua, impecável em suas funções,
sussurra vassouras e motores,
ao tempo que os pássaros acima ignoram
a otimista conjuntura da economia internacional.
A desordem passou. O controle do homem
se restabelece e impõe até que o juízo
torne-se novamente insuportável.
No terraço ficou só uma garrafa de vinho, vazia,
ainda transbordando um possível amor entre os homens..."
(Marcos Pasche)

O DUPLO

"Debaixo de minha mesa
tem sempre um cão faminto
-que me alimenta a tristeza.
Debaixo de minha cama
tem sempre um fantasma vivo
-que perturba quem me ama.
Debaixo de minha pele
alguém me olha esquisito
-pensando que eu sou ele.
Debaixo de minha escrita
há sangue em lugar de tinta
-e alguém calado que grita..."
(Affonso Romano)

MADRIGAL MELANCÓLICO

"O que eu adoro em ti, não é a tua beleza.
A beleza, é em nós que ela existe.
A beleza é um conceito. E a beleza é triste.
Não é triste em si,
Mas pelo que há nela de fragilidade e de incerteza.
O que eu adoro em ti, não é a tua inteligência.
Não é o teu espírito sutil, tão ágil, tão luminoso,
- Ave solta no céu matinal da montanha.
Nem a tua ciência do coração dos homens e das coisas.
O que eu adoro em ti, não é a tua graça musical,
Sucessiva e renovada a cada momento,
Graça aérea como o teu próprio pensamento,
Graça que perturba e que satisfaz.
O que eu adoro em ti, não é a mãe que já perdi.
Não é a irmã que já perdi. E meu pai...
O que eu adoro em tua natureza,
Não é o profundo instinto maternal
Em teu flanco aberto como uma ferida.
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza.
O que eu adoro em ti -lastima-me e consola-me!
O que eu adoro em ti, é a vida..."
(Manuel Bandeira)

MUNDO PEQUENO...

"O mundo meu é pequeno, Senhor.
Tem um rio e um pouco de árvores.
Nossa casa foi feita de costas para o rio.
Formigas recortam roseiras da avó.
Nos fundos do quintal há um menino
e suas latas maravilhosas.
Todas as coisas deste lugar
já estão comprometidas com aves.
Aqui, se o horizonte enrubesce um pouco,
os besouros pensam que estão no incêndio.
Quando o rio está começando um peixe,
Ele me coisa
Ele me rã
Ele me árvore.
De tarde um velho tocará sua flauta
para inverter os ocasos..."
(Manoel de Barros)

AGORA SEI QUEM SOU...

"Agora sei quem sou.
Sou pouco, mas sei muito,
porque sei o poder imenso que morava comigo,
mas adormecido como um peixe grande
no fundo escuro e silencioso do rio
e que hoje é como uma árvore plantada
bem alta no meio da minha vida.
Agora sei as coisa como são.
Sei porque a água escorre meiga
e porque acalanto é o seu ruído na noite estrelada
que se deita no chão da nova casa.
Agora sei as coisas poderosas
que valem dentro de um homem.
Aprendi contigo, amada.
Aprendi com a tua beleza,
com a macia beleza de tuas mãos,
teus longos dedos de pétalas de prata,
a ternura oceânica do teu olhar,
verde de todas as cores e sem nenhum horizonte;
com tua pele fresca e enluarada,
a tua infância permanente,
tua sabedoria fabulária brilhando distraída no teu rosto.
Grandes coisas simples aprendi contigo,
com o teu parentesco com os mitos mais terrestres,
com as espigas douradas no vento,
com as chuvas de verão e com as linhas da minha mão.
Contigo aprendi que o amor reparte mas sobretudo acrescenta,
e a cada instante mais aprendo
com o teu jeito de andar pela cidade
como se caminhasses de mãos dadas com o ar,
com o teu gosto de erva molhada,
com a luz dos teus dentes,
tuas delicadezas secretas,
a alegria do teu amor maravilhado,
e com a tua voz radiosa que sai da tua boca
inesperada como um arco-íris
partindo ao meio e unindo os extremos da vida,
e mostrando a verdade como uma fruta aberta..."
(Thiago de Mello)

RUA DA AMARGURA

"A minha rua é longa e silenciosa como um caminho que foge
E tem casas baixas que ficam me espiando de noite
Quando a minha angústia passa olhando o alto.
A minha rua tem avenidas escuras e feias
De onde saem papéis velhos correndo com medo do vento
E gemidos de pessoas que estão eternamente à morte.
A minha rua tem gatos que não fogem e cães que não ladram
Tem árvores grandes que tremem na noite silente
Fugindo as grandes sombras dos pés aterrados.
A minha rua é soturna...
Na capela da igreja há sempre uma voz que murmura louvemos
Sozinha e prostrada diante da imagem
Sem medo das costas que a vaga penumbra apunhala.
A minha rua tem um lampião apagado
Na frente da casa onde a filha matou o pai
Porque não queria ser dele.
No escuro da casa só brilha uma chapa gritando quarenta.
A minha rua é a expiação de grandes pecados
De homens ferozes perdendo meninas pequenas
De meninas pequenas levando ventres inchados
De ventres inchados que vão perder meninas pequenas.
É a rua da gata louca que mia buscando os filhinhos nas portas das casas
É a impossibilidade de fuga diante da vida
É o pecado e a desolação do pecado
É a aceitação da tragédia e a indiferença ao degredo
Com negação do aniquilamento.
É uma rua como tantas outras
Com o mesmo ar feliz de dia e o mesmo desencontro de noite.
É a rua por onde eu passo a minha angústia
Ouvindo os ruídos subterrâneos como ecos de prazeres inacabados.
É a longa rua que me leva ao horror do meu quarto
Pelo desejo de fugir à sua murmuração tenebrosa
Que me leva à solidão gelada do meu quarto..."
(Vnícius de Moraes)

SONETO DA SEPARAÇÃO

"De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente..."
(Vinícius de Moraes)

O BORRÃO VERMELHO DE SANGUE

"Quero escrever o borrão vermelho de sangue
com as gotas e coágulos pingando de dentro para dentro.
Quero escrever amarelo-ouro com raios de translucidez.
Que não me entendam pouco-se-me-dá.
Nada tenho a perder.
Jogo tudo na violência que sempre me povoou,
o grito áspero e agudo e prolongado,
o grito que eu, por falso respeito humano, não dei.
Mas aqui vai o meu berro
me rasgando as profundas entranhas
de onde brota o estertor ambicionado.
Quero abarcar o mundo com o terremoto causado pelo grito.
O clímax de minha vida será a morte.
Quero escrever noções sem o uso abusivo da palavra.
Só me resta ficar nua: nada tenho mais a perder..."
(Clarice Lispector)

ORAÇÃO DO MILHO

"Senhor, nada valho.
Sou a planta humilde dos quintais pequenos
e das lavouras pobres.
Meu grão, perdido por acaso,
nasce e cresce na terra descuidada.
Ponho folhas e haste, e, se me ajudardes, Senhor,
mesmo planta de acaso, solitária,
dou espigas e devolvo em muitos grãos
o grão perdido inicial, salvo por milagre,
que a terra fecundou.
Sou a planta primária da lavoura.
Não me pertence a hierarquia tradicional do trigo,
de mim não se faz o pão alvo universal.
O justo não me consagrou Pão de Vida
nem lugar me foi dado nos altares.
Sou apenas o alimento forte e substancial
dos que trabalham a terra,
alimento de rústicos e animais de jugo.
Quando os deuses da Hélade corriam pelos bosques,
coroados de rosas e de espigas,
e os hebreus iam em longas caravanas
buscar na terra do Egito o trigo dos faraós,
quando Rute respigava cantando nas searas de Booz
e Jesus abençoava os trigais maduros,
eu era apenas o bró nativo das tabas ameríndias.
Fui o angu pesado e constante do escravo
na exaustão do eito.
Sou a broa grosseira e modesta do pequeno sitiante.
Sou a farinha econômica do proprietário,
Sou a polenta do imigrante
e a amiga dos que começam a vida em terra estranha.
Alimento de porcos e do triste mu de carga,
o que me planta não levanta comércio,
nem avantaja dinheiro.
Sou apenas a fartura generosa
e despreocupada dos paióis.
Sou o cocho abastecido donde rumina o gado.
Sou o canto festivo dos galos
na glória do dia que amanhece.
Sou o cacarejo alegre das poedeiras
à volta dos ninhos.
Sou a pobreza vegetal agradecida a vós,
Senhor, que me fizestes necessário e humilde.
Sou o milho!"
(Cora Coralina)

MOTIVO

"Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei.
Não sei se fico ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada..."
(Cecília Meirelles)

ATO DE CONTRIÇÃO

"Ah, como somos comedidos!
Acomodamo-nos, vãos, nos limites do concebido.
Somos bem educados, cultos,
e ruge tanta fome nos apetites fora do concedido.
Ah, como somos sob medida!
Sub metidos, hirtos, bem vestidos,
robôs impecáveis, ilusão de vida.
Ah, somos como os subvertidos,
introvertida soma de extrovertidos por pompa,
tinta, arroto ou brilhantina.
Filhos do instante, do entanto e do porém,
somos através, como os vidros,
mas opacos e pervertidos, sempre aquém.
Traçamos sinas e abstrações,
terçamos ódio finos, dissuadidos,
lãs de olvido e alucinações.
Sovamos os sidos, os vividos,
somos eiva, disfarce, diluição.
Somos somas a subtrações..."
(Artur da Távola)

SEUS OLHOS

"De vivo luzir, estrelas incertas,
que as águas dormentes do mar vão ferir;
Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
Têm meiga expressão,Mais doce que a brisa,
-Mais doce que o nauta de noite cantando,
-Mais doce que a frauta quebrando a solidão,
Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
De vivo luzir, são meigos infantes, gentis,
Engraçados, brincando a sorrir.
São meigos infantes, brincando,
Saltando em jogo infantil, inquietos,
Travessos; -causando tormento,
Com beijos nos pagam a dor de um momento,
Com modo gentil.
Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
Assim é que são;
Às vezes luzindo, serenos, tranqüilos,
Mas às vezes vulcão! Às vezes, oh! sim,
Derramam tão fraco, tão frouxo brilhar,
Que a mim me parece que o ar lhes falece,
E os olhos tão meigos, que o pranto umedece
Me fazem chorar...
Assim lindo infante, que dorme tranqüilo,
Desperta a chorar; e mudo e sisudo,
Cismando mil coisas, não pensa -a pensar.
Nas almas tão puras da virgem, do infante,
Às vezes do céu cai doce harmonia
Duma harpa celeste, um vago desejo;
E a mente se veste de pranto co'um véu.
Quer sejam saudades, quer sejam desejos
Da pátria melhor;
Eu amo seus olhos que choram em causa
Um pranto sem dor....
Eu amo seus olhos tão negros, tão puros,
De vivo fulgor;
Seus olhos que exprimem tão doce harmonia,
Que falam de amores com tanta poesia,
Com tanto pudor...
Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros,
Assim é que são; eu amo esses olhos
que falam de amores com tanta paixão..."
(Gonçalves Dias)

A UMA AUSÊNCIA...

"Sinto-me, sem sentir, todo abrasado
No rigoroso fogo que me alenta;
O mal, que me consome, me sustenta;
O bem, que me entretém, me dá cuidado.
Ando sem me mover, falo calado;
O que mais perto vejo, se me ausenta,
E o que estou sem ver, mais me atormenta;
Alegro-me de ver-me atormentado.
Choro no mesmo ponto em que me rio;
No mor risco me anima á confiança;
Do que menos se espera estou mais certo.
Mas se de confiado desconfio,
É porque, entre os receios da mudança,
Ando perdido em mim como em deserto..."
(António Barbosa Bacelar)

UM DIA NEGRO...

"Esqueceram fechados meus olhos
Aberta minha boca
Que vomita palavras destruidoras
Esqueceram meu corpo moribundo
Esqueceram as dores que não se apaga
A mente alerta segue quieta
Ando por caminhos escuros
Segurando com força o fogo
Que queimou a beleza das minhas mãos
É um dia negro...
As sombras na parede tentam me abraçar
Alcançar meu corpo,
Tirar o sorriso tatuado em mim
É um dia negro como o sangue
Esse sangue deixado pelo caminho
É um dia negro...
São chuvas que doem
São abraços partidos
São beijos sem cor
É um dia negro..."
(Alexandre Ferreira)

O FIM DO MUNDO

"No fim de um mundo melancólico
os homens lêem jornais.
Homens indiferentes a comer laranjas
que ardem como o sol.
Me deram uma maçã para lembrar a morte.
Sei que cidades telegrafam
pedindo querosene.
O véu que olhei voar caiu no deserto.
O poema final ninguém escreverá
desse mundo particular de doze horas.
Em vez de juízo final
a mim me preocupa o sonho final..."
(João Cabral de Melo Neto )

ANJOS DO CÉU

"As ondas são anjos que dormem no mar,
Que tremem, palpitam, banhados de luz...
São anjos que dormem, a rir e sonhar
E em leito d'escuma revolvem-se nus!
E quando de noite vem pálida a lua
Seus raios incertos tremer, pratear,
E a trança luzente da nuvem flutua,
As ondas são anjos que dormem no mar!
Que dormem, que sonham -e o vento dos céus
Vem tépido à noite nos seios beijar!
São meigos anjinhos, são filhos de Deus,
Que ao fresco se embalam do seio do mar!
E quando nas águas os ventos suspiram,
São puros fervores de ventos e mar:
São beijos que queimam... e as noites deliram,
E os pobres anjinhos estão a chorar!
Ai! quando tu sentes dos mares na flor
Os ventos e vagas gemer, palpitar,
Por que não consentes, num beijo de amor
Que eu diga-te os sonhos dos anjos do mar?"
(Álvares de Azevedo )

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

SOPRA UM VENTO...

"Sopra um vento entre mim e ti
nascido como todos
quando escavávamos dentro de nós
escavando a distância
foi já tempestade fechada em nevoeiro
hoje é apenas brisa afrouxada na distância
recebo esse sopro suave como uma carícia
de quem ao largo me acena enquanto parte
sempre entre nós um vento ar com que te respiro
enquanto o longe nos escava a distância..."
(Ana Viana)

CHAMO POR TI...

"Como se o teu amor tivesse outro nome no teu nome,
chamo por ti; e o som do que digo é o amor
que ao teu corpo substitui a doçura de um pronome
- tu, a sílaba única de uma eclosão de flor.
Diz-me, então, por que vens ter comigo
no puro despertar da minha solidão?
E que murmúrio lento de uma cantiga de amigo
nos repete o amor numa insistência de refrão?
É como se nada tivesse para te dizer
quando tu és tudo o que me habita os lábios:
linguagem breve de gestos sábios
que os teus olhos me dão para beber..."
(Nuno Júdice )

LONGE...

"Há uma gramática aberta no teu corpo,
e soletro cada palavra que o teu olhar me oferece.
Limpo as sílabas que te escorrem pelo rosto
com um lenço de vidro,
descobrindo a tua transparência.
E sais de dentro de um pó de advérbios,
para que eu te dê um nome,
e a vida volte a correr por ti..."
(Nuno Júdice)

CHEGASTE...

"Chegaste
com a tua tesoura de jardineiro
e começaste a cortar:
umas folhas aqui e ali
uns ramos que não doeram…
Eu estava desprevenida
quando arrancaste a raiz..."
(Yvette K. Centeno)

EU AMO TUDO O QUE FOI...

"Eu amo tudo o que foi,
Tudo o que já não é,
A dor que já me não dói,
A antiga e errônea fé,
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia."
(Fernando Pessoa)

A TRISTEZA DOS OLHOS...

"Não estou falando de um mundo cor-de-rosa...
ou de pessoas perfeitas, prontas para nos acolher,
amar, caminhar ao nosso lado...
Não falo disso, mas da tristeza nos olhos
de quem vira as costas e a gente não vê.
A beleza por dentro de um peito que a gente não sente.
A solidão de quem afasta um amor,
e se deita em camas tão frias.
É quando os olhos se perdem no nada
e nenhuma mentira é capaz de enganar a si mesmo.
É desse instante solitário, sem abraço, que eu digo.
Todo mundo vai virar as costas
ou dizer que merece coisa melhor
ou debochar das mentiras que eles contaram...
mas, a gente pode sempre voltar e acolher com amor,
ser os primeiros a começar.
Afinal, se a hostilidade do mundo despertar a nossa,
quem vai ser o primeiro a sorrir?"
(Rita Apoena)

ALGUM DIA, TALVEZ...

"Algum dia, talvez,
nada mais vai ser assim.
Algum dia, talvez,
os homens terão a primavera que desejarem,
no momento que quiserem,
independentes deste ritmo, desta ordem,
deste movimento do céu.
E os pássaros serão outros,
com outros cantos e outros hábitos,
-e os ouvidos que por acaso os ouvirem
não terão nada mais com tudo aquilo
que outrora se entendeu e amou..."
(Cecilia Meirelles)

O QUE ACONTECEU...

"Mais do que é permitido,
mais do que é preciso,
como um delírio de poeta
sobrecarregando o sonho:
a pelota do coração tornou-se enorme,
enorme o amor, enorme o ódio.
Sob o fardo, as pernas vão vacilantes.
Tu o sabes, sou bem fornido,
entretanto me arrasto,
apendice do coração,
vergando as espáduas gigantes.
Encho-me dum leite de versos
e, sem poder transbordar,
encho-me mais e mais..."
(Maiakóvski)

NÃO SOU PARA TODOS...

"Não sou pra todos.
Gosto muito do meu mundinho.
Ele é cheio de surpresas,
palavras soltas e cores misturadas.
Às vezes tem um céu azul,
outras tempestade.
Lá dentro cabem sonhos de todos os tamanhos,
mas não cabe muita gente.
Todas as pessoas que estão dentro dele
não estão por acaso.
São necessárias.
-E quem pode comigo
quando eu digo tudo o que sinto?"
(Caio Fernando Abreu)

TUDO O QUE EXISTE...

"O que me tranqüiliza é que tudo o que existe,
existe com uma precisão absoluta.
O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete
não transborda nem uma fração de milímetro
além do tamanho de uma cabeça de alfinete.
Tudo o que existe é de uma grande exatidão.
Pena é que a maior parte do que existe
com essa exatidão nos é tecnicamente invisível.
O bom é que a verdade chega a nós
como um sentido secreto das coisas.
Nós terminamos adivinhando,
confusos, a perfeição...".
(Clarice Lispector)

NINGUÉM NUNCA AMOU...

"De almas sinceras a união sincera
Nada há que impeça: amor não é amor
Se quando encontra obstáculos se altera,
Ou se vacila ao mínimo temor.
Amor é um marco eterno, dominante,
Que encara a tempestade com bravura;
É astro que norteia a vela errante,
Cujo valor se ignora, lá na altura.
Amor não teme o tempo, muito embora
Seu alfange não poupe a mocidade;
Amor não se transforma de hora em hora,
Antes se afirma para a eternidade.
Se isso é falso, e que é falso alguém provou,
Eu não sou poeta, e ninguém nunca amou...".
(Shakespeare)

SONETO DA SAUDADE

"Em minh’alma chove tanto
que não há como esconder
entre os olhos tanto pranto
que meu pranto faz chover
Por encanto ou desencanto
em minh’alma é anoitecer
com saudade do teu canto
no encanto do amanhecer
Num jardim sem claridade
mora em mim tua saudade
com o meu modo de viver
E a saudade não consegue
esquecer que me persegue
para eu nunca te esquecer..."
(Afonso Estebanez)

OS MILAGRES QUE TE CERCAM...

"A noite se vestiu de renda
convidou os anjos e fez uma festa
ao acender estrelas...
Depois, chamou as fadas encomendou a elas
um jardim de rosas e lindas azaléias...
Pra quando você acordar tudo esteja tão belo
que você não perceba que enquanto dormia
a noite esteve a tecer os milagres que te cercam..."
(Sirlei L. Passolongo)

PASSAGEM

"Tem uma passagem estreita dentro de mim,
tão estreita que suas paredes me lenham toda,
mas essa passagem desemboca na largura de Deus.
Nem sempre tenho força para atravessar
este deserto sangrento, mesmo sabendo que,
se me forçar a me doer todo entre as paredes,
mesmo sabendo que desembocarei para a luz aberta
de uma dia trêmulo de sol macio..."
(Clarice Lispector)

GENTE TÃO NECESSÁRIA...

"Acende a ilusão e as roseiras;
Que só com um sorriso entre os olhos
Nos convida a viajar por outras terras,
Nos faz percorrer toda a magia.
Tem gente que basta dar a mão
Rompe a solidão, põe a mesa,
Serve o cozido, coloca as grinaldas;
Que basta empunhar uma guitarra
Compõe uma sinfonia caseira.
Tem gente que mal abre a boca
Chega a todos os limites da alma,
Alimenta uma flor, inventa sonhos,
Faz o vinho cantar...
E fica como se nada tivesse acontecido.
E assim vamos apaixonados com a vida
Desterrando uma morte solitária,
Pois sabemos que na volta da esquina
Encontramos gente
Que é assim tão necessária..."
(Hamlet Lima Quintana)

ROMANTISMO

"Seremos ainda românticos
-e entraremos na densa mata,
em busca de flores de prata,
de aéreos, invisíveis cânticos.
Nas pedras, à sombra, sentados,
respiraremos a frescura
dos verdes reinos encantados
das lianas e da fonte pura.
E tão românticos seremos
de tão magoado romantismo,
que as folhas dos galhos supremos
que se desprenderem no abismo
pousarão na nossa memória
-secas borboletas caídas-
e choraremos sua história,
-resumo de todas as vidas." 
(Cecilia Meireles)

A GENTE SEGUE SÓ...

"Quando sair, vá guiando seu sonho.
Traga um espanto longo para não cair de novo.
Enquanto isso, quem sabe:
Ver o estampado das estrelas brilhando em silêncio...
É sábio reconhecer quando elas iluminam
E de graça desafiam outro tempo no firmamento.
Assim tudo passa, o caminho não eterniza.
Um olhar de repente traz aviso
Que a gente segue mesmo só..."

POEMAS SÃO PÁSSAROS...

""Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam no livro que lês.
Quando fechas o livro,
eles alçam vôo como de um alçapão.
Eles não têm pouso nem porto;
alimentam-se um instante
em cada par de mãos e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...""
(Mário Quintana)

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

CORAÇÃO LEVIANO...

"Não seja leviano com o coração dos outros.
Não ature gente de coração leviano.
Não perca tempo com inveja.
Não esqueça os elogios que receber.
Esqueça as ofensas. Se conseguir isso, me ensine.
Guarde as antigas cartas de amor.
Não se sinta culpado por não saber o que fazer da vida.
Faça o que fizer não se auto congratule demais,
nem seja severo demais com você.
As suas escolhas tem sempre metade das chances de dar certo.
É assim para todo mundo.
Desfrute de seu corpo use-o de toda maneira que puder, mesmo!
Não tenha medo de seu corpo
ou do que as outras pessoas possam achar dele.
É o mais incrível instrumento que você jamais vai possuir.
Entenda que amigos vão e vem,
mas nunca abra mão de uns poucos e bons.
Esforce-se de verdade
para diminuir as distâncias geográficas e de estilos de vida,
porque quanto mais velho você ficar,
mais você vai precisar das pessoas que você conheceu quando jovem.
Aceite certas verdades inescapáveis!
E não espere que ninguém segure a sua barra..."
(Pedro Bial)

AMADURECIMENTO

"A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são seis horas!
Quando se vê, já é sexta-feira...
Quando se vê, já terminou o ano...
Quando se vê, perdemos o amor da nossa vida.
Quando se vê, já passaram-se 50 anos!
Agora é tarde demais para ser reprovado.
Se me fosse dado, um dia, outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio.
Seguiria sempre em frente e iria jogando, pelo caminho,
a casca dourada e inútil das horas.
Desta forma, eu digo:
Não deixe de fazer algo que gosta, devido à falta de tempo,
pois a única falta que terá, será desse tempo
que infelizmente não voltará mais..."
(Mario Quintana)

O MEDO DO AMOR

"Eu não tenho medo do amor.
Eu tenho medo é de amar quem tem medo dele.
Amar quem teme o amor
é como se apaixonar por uma sucessão de desistências.
É como viver apenas a possibilidade de algo,
mas com a sensação de que ela nunca se estabelecerá.
É ficar intranquilo não com o amanhã,
mas com os próximos minutos.
Quem teme o amor vai embora antes de fazer as pazes com ele.
de saber que surpresas ele reservava.
Quem teme o amor teme caminhar de mãos vazias
em direção ao desconhecido.
Está sempre baseado numa repetição do passado.
E acha que a vida será como todos aqueles dias idos.
Quem teme o amor não vê a pessoa que conheceu,
não se dá a oportunidade de ser amado de outra forma.
Quem teme o amor se envolve
é com o drama de todas as feridas que vieram à tona
porque ele não se permitiu ficar sozinho
e confuso o suficiente para curá-las.
Quem teme o amor não aprendeu a pedir ajuda
nem a receber a cura do Universo.
Ele se acha maior que o amor e não conjuga o verbo.
Quem teme o amor consegue ser mais perverso
do que quem o magoou.
Quem tem medo do amor, pra se preservar,
não se permite delirar lindamente....
e perde a parcela mais deliciosa que o amor prometeu....
por medo de amar."
(Marla de Queiroz)

SAUDADE...

"Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...
Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos machuca,
é não ver o futuro que nos convida...
Saudade é sentir que existe o que não existe mais...
Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam...
Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.
E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.
O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido..."
(Pablo Neruda )

GUERREIRO SEM FARDAS

"Não posso acreditar
que será a última palavra
impressa em tua desistência
com tintas de tristeza
manchadas pela incerteza
de fazer o que não se deseja.
Não diga que não me verei em teus olhos,
que não abrirei teu sorriso
com um simples abraço ao te despertar.
Eu não aceito um discurso frio
querendo cobrir esse imenso vazio
que ecoa em teus gestos.
Eu ouço tua monossílaba mergulhada em lágrimas
que tua lástima não consegue esconder.
E não adianta fugir de quem você é
e do que realmente quer.
A liberdade é prender-se ao que se deseja,
onde quer que esteja a nossa mais bela metade.
Pois estou aqui como um guerreiro sem fardas
e que minha única arma é meu amor por você..."
(Cristian Ribas)

VOCÊ ME ENCANTA...

"A surpresa esperada de sua chegada,
veio como romper do sol desbravando a noite escura,
roubou os meus sentidos, invadiu o meu querer
e estilhaçou as vidraças do meu coração...
Me senti flutuando em uma viagem de fantasias e sonhos
ao contemplar os seus olhos
e desenhar na memória o seu rosto.
Não ofereci resistência aos seus encantos
e me deixei levar pela fascinação que domina as emoções,
cedi as barreiras e somente os limites de nós dois
deram a dimensão desta plena e total sedução.
Ainda bem que um dia sem querer te encontrei
e hoje me sinto tão feliz, quando é o coração que abre a porta
então está tudo bem, tudo certo
e quem é que não gosta de se sentir assim,
confiante no sentimento mais doce e mais suave
que existe entre duas pessoas.
Estou aqui para te dizer que não sabemos
o quanto pode ser eterno nossos momentos,
mais com toda certeza serão para sempre inesquecíveis..."

AMO-TE...

"Amo-te como a planta que não floriu
e tem dentro de si, escondida, a luz das flores,
e, graças ao teu amor, vive obscuro em meu corpo
o denso aroma que subiu da terra.
Amo-te sem saber como, nem quando,
nem onde amo-te diretamente
sem problemas nem orgulho...
amo-te assim porque não sei amar de outra maneira,
a não ser deste modo em que nem eu sou nem tu és,
tão perto que a tua mão no meu peito é minha,
tão perto que os teus olhos se fecham com meu sono..."
(Pablo Neruda)

TODO MUNDO VAI EMBORA...

"Em algum momento, em vários deles ou definitivamente,
as pessoas sempre vão embora.
Talvez essa seja a pior coisa do mundo.
Ele vai embora, sempre,
quando eu preciso de quinze minutos de silêncio
complementar à minha entrega,
odeio o desespero dele por banhos
e a sua ansiedade curiosa pelo que vem depois.
Que se dane o depois, eu sou agora, ou pelo menos era.
Ele vai embora, sempre,
quando o parágrafo passa de três linhas,
o pensamento dele ultrapassa meus olhos,
o som se perde da minha boca
para qualquer outro canto do mundo
que não tenha seus ouvidos
e ele olha fixamente para qualquer outra coisa
que não seja a minha existência...
Sempre a mesma cara de tédio e de busca
pelo resto que não se repete ou não se prolonga.
Ele sempre vai embora
quando eu queria que ele se perdesse um pouco,
rasgasse a agenda, lançasse o celular no rio,
desligasse todos os toques,
luzes e sinais de que há todo o resto.
Esquecesse do sono, do livro, da planta, das lembranças.
Ele sempre vai embora do meu mundo
quando eu só queria que ele descansasse
um pouco de ser ele o tempo todo,
mas ele tem muito medo de não ser ele,
talvez porque ele não saiba o que ele é.
Ele sempre vai embora pra descobrir quem ele é,
ou para lembrar que ele é o mesmo de sempre
que não sabe quem é,
ele sempre vai embora
antes da gente ser alguma coisa juntos.
Vivo com essa sensação de abandono,
de falta, de pouco, de metade.
Mas nada disso é novidade.
Antes dele, teve o outro,
o outro que continua indo embora para sempre
porque nunca foi embora pra sempre.
Eu não sei deixar ninguém partir,
eu não sei escolher, excluir, deletar.
São as pessoas que resolvem me deixar,
melhor assim,
adoro não ser responsável por absolutamente nada,
odeio o peso que uma despedida eterna causa em mim.
Nada é eterno, não quero brincar de Deus.
O outro foi embora a primeira vez
porque estava bêbado demais,
foi embora a segunda porque ficou tarde,
foi embora a terceira porque teve medo de ficar pra sempre,
foi embora durante alguns longos anos
porque todo o resto do mundo precisava dele
e eu era apenas uma das demandas.
Ele me chamou de demanda
a última vez que foi embora pra sempre,
mas pra sempre pode durar duas horas,
dois anos ou duas encarnações.
A gente sempre se despede
lembrando da música do Chico que diz:
"O amor não tem pressa, ele sabe esperar em silêncio".
Antes dele teve ainda um outro
que sempre ia embora na espera
de que existisse algo melhor do que eu,
mas não ia definitivamente
porque não é todo dia que aparece alguém melhor do que eu.
Um dia apareceu, ela até que é bonita e tal,
não parece tão confusa e intensa
e talvez mediocridade seja
de que uma pessoa precise para ser feliz.
Mas a última vez que ele foi embora,
antes me deu um abraço de quem nunca saiu do mesmo lugar.
O abraço e o seu olhar
de quem nunca sabe direito porque vai embora
ficaram pra sempre comigo..."
(Tati Bernardi)

DEDUÇÃO

"Não acabarão nunca com o amor,
nem as rusgas, nem a distância.
Está provado, pensado, verificado.
Aqui levanto solene
minha estrofe de mil dedos
e faço o juramento:
Amo firme, fiel e verdadeiramente..."
(Vladimir Mayakovsky)

HONESTAMENTE ASSIM...

"...e de novo então me vens e me chegas
e me invades e me tomas e me pedes
e me perdes e te derramas sobre mim
com teus olhos sempre fugitivos
e abres a boca para libertar novas histórias
e outra vez me completo assim, sem urgências,
e me concentro inteiro nas coisas que me contas,
e assim calado, e assim submisso,
te mastigo dentro de mim
enquanto me apunhalas com lenta delicadeza
deixando claro em cada promessa que jamais será cumprida,
que nada devo esperar além dessa máscara colorida,
que me queres assim porque é assim que és
e unicamente assim é que me queres e me utilizas todos os dias,
e nos usamos honestamente assim..."
(Caio Fernando Abreu)

TENTANDO TE DECIFRAR...

"Que coisas são essas que me dizes sem dizer,
escondidas atrás do que realmente quer dizer?
Tenho me confundido na tentativa de te decifrar,
todos os dias.
Mas confuso, perdido, sozinho,
minha única certeza é que de cada vez aumenta
ainda mais minha necessidade de ti.
Torna-se desesperada, urgente.
Eu já não sei o que faço.
Não sinto nenhuma outra alegria além de ti.
Como pude cair assim nesse fundo poço?
Quando foi que me desequilibrei?
Não quero me afogar:
Quero beber tua água.
Não te negues, minha sede é clara..."
(Caio Fernando Abreu)

SE MORRE DE AMOR...

"Sentir, sem que se veja, a quem se adora
Compreender, sem lhe ouvir, seus pensamentos,
Segui-la, sem poder fitar seus olhos,
Amá-la, sem ousar dizer que amamos,
E, temendo roçar os seus vestidos,
Arder por afogá-la em mil abraços:
Isso é amor, e desse amor se morre!"
(Gonçalves Dias)

PENSANDO EM DORMIR COM VOCÊ...

"Quando a noite chegar cedo e a neve cobrir as ruas,
ficarei o dia inteiro na cama pensando em dormir com você.
Quando estiver muito quente,
me dará uma moleza de balançar devagarinho
na rede pensando em dormir com você.
Vou te escrever carta e não te mandar.
Vou tentar recompor teu rosto sem conseguir.
Vou ver Júpiter e me lembrar de você.
Vou ver Saturno e me lembrar de você.
Daqui a vinte anos voltarão a se encontrar.
O tempo não existe.
O tempo existe, sim, e devora.
Vou procurar teu cheiro no corpo de outra mulher.
Sem encontrar, porque terei esquecido.
Alfazema? -Alecrim.
Quando eu olhar a noite enorme do Equador,
pensarei se tudo isso foi um encontro ou uma despedida.
E que uma palavra ou um gesto, seu ou meu,
seria suficiente para modificar nossos roteiros..."
(Caio Fernando Abreu)

POR QUEM OS SINOS DOBRAM...

"Nenhum homem é uma ilha, sozinho em si mesmo;
cada homem é parte do continente, parte do todo;
se um seixo for levado pelo mar, a Europa fica menor,
como se fosse um promontório,
assim como se fosse uma parte de teus amigos ou mesmo tua;
a morte de qualquer homem me diminui,
porque eu sou parte da humanidade;
e por isso, nunca mandes indagar por quem os sinos dobram.
Eles dobram por ti..."
(John Donne)

SOMBRAS SERENAS...

"Traze-me um pouco das sombras serenas
que as nuvens transportam por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas,
-vê que nem te peço alegria.
Traze-me um pouco da alvura dos luares
que a noite sustenta no teu coração!
A alvura, apenas, dos ares:
-vê que nem te peço ilusão.
Traze-me um pouco da tua lembrança,
aroma perdido, saudade da flor!
-Vê que nem te digo -esperança!-
Vê que nem sequer sonho -amor!"
(Cecília Meireles)

MEU MUNDO...

"Meu mundo se resume
a palavras que me perfuram,
a canções que me comovem,
a paixões que já nem lembro,
a perguntas sem respostas,
a respostas que não me servem,
à constante perseguição do que ainda não sei.
Meu mundo se resume ao encontro
do que é terra e fogo dentro de mim,
onde não me enxergo,
mas me sinto..."
(Martha Medeiros)

VIVER TEM QUE SER PERTURBADOR...

"Sempre desprezei as coisas mornas,
as coisas que não provocam ódio nem paixão,
as coisas definidas como mais ou menos,
um filme mais ou menos,
um livro mais ou menos.
Tudo perda de tempo.
Viver tem que ser perturbador,
é preciso que nossos anjos e demônios sejam despertados,
e com eles sua raiva, seu orgulho, seu asco,
sua adoração ou seu desprezo.
O que não faz você mover um músculo,
o que não faz você estremecer, suar, desatinar,
não merece fazer parte da sua biografia..."
(Martha Medeiros)

PERDENDO O JUÍZO...

"Ando falando com as paredes
Vivendo a vida por tabela
Comendo na beira do prato
Tentando entender teu descaso
Me pendura no cabide,
Dorme com minha roupa...
Me tira do sério
me envolve em mistérios...
To perdendo meu juizo
Já não quero mais essa arte
Pode levar teu estandarte
Guarda teu traje de amigo
Não é disso que preciso
Estou do lado do avêsso
Nem sei se me reconheço
Prefiro ficar sem assunto
Do que tentar chegar junto
Me perdendo em teu olhar
Mas estou certa que um dia
Voce vai me procurar e...
Na virada da gamela
Voce vai encontrar
Aquelas bobagens
Que eu chamava de amor..."
(Ana Lucia Camargo)

FLORES...

"É nestas flores, em particular,
que vejo desenhar-se uma linha
que me leva de mim a ti,
passando sobre um campo invisível,
onde já não se ouvem os pássaros,
e onde o vento não faz cair as folhas.
Estamos em frente de um canteiro puramente abstrato,
e cada uma destas flores
nasceu das frases em que o amor se manifesta,
e do movimento dos dedos sobre a pele,
traçando um fio de horizonte
em que os meus olhos se perdem.
Por isso estão vivas,
e alimentam-se da seiva que bebem nos teus lábios,
quando os abres, e por instantes a vida inteira
se resume ao sorriso que neles se esboça..."
(Nuno Júdice)

O HOMEM DE MUNIQUE...

"O homem que falava sozinho
Na estação central de Munique
Que língua falava?
Que língua falam os que se perdem assim,
Nos corredores das estações de comboio, à noite,
Quando já nenhum quiosque vende jornais e cafés?
O homem de munique não me pediu nada,
Nem tinha o ar de quem precisasse de alguma coisa,
Isto é, tinha aquele ar de quem chegou ao último estado
Que é o de quem não precisa nem de si próprio.
No entanto, falou-me: numa língua sem correspondência
Com linguagem alguma de entre as possíveis
De exprimirem emoção ou sentimento,
Limitando-se a uma sequência de sons
Cuja lógica a noite contrariava.
Perguntar-me-ia se eu compreendia acaso a sua língua?
Ou queria dizer-me o seu nome e de onde vinha
-A àquela hora em que não estava nenhum comboio
Nem para chegar nem para partir?
Se me dissesse isto, ter-lhe-ia respondido
Que também eu não esperava ninguém,
Nem me despedia de alguém,
Naquele canto de uma estação alemã;
Mas poderia lembrar-lhe que há encontros
Que só dependem do acaso, e que não precisam
De uma combinação prévia para se realizarem.
-É então que os horóscopos adquirem sentido;
E a própria vida, para além deles, dá um destino
À solidão que empurra alguém para uma estação deserta,
À hora em que já não se compram jornais nem se tomam cafés,
Restituindo um resto de alma ao corpo ausente
-O suficiente para que se estabeleça um diálogo,
Embora ambos sejamos a sombra do outro.
É que, a certas horas da noite,
Ninguém pode garantir a sua própria realidade,
Nem quando outro como eu próprio,
Testemunhou toda a solidão do mundo
Arrastada num deambular de frases sem sentido
Numa estação morta..."
(Nuno Júdice)

A GESTAÇÃO DA AMIZADE...

"Toda amizade é uma história particular.
É uma história de conquista.
Primeiro, descobre-se o outro.
Todo mundo parece igual, mas não é.
E é justamente essa coisinha diferente em cada um
Que torna cada pessoa única.
E de repente ali está a sementinha da amizade fecundada.
A gestação começa.
São pedacinhos de nós que vão ficando nas conversas
E pedacinhos do coração do outro
Que vão acaminhando para dentro da gente.
Há os risos e os sorrisos,
A partilha de coisas simples ou de coisas importantes.
As descobertas, cheias de surpresas muitas vezes.
A voz calada que pensa, não diz nada... adivinha!...
Fazemos idéia imediata de uma pessoa ao primeiro contato.
Julgamos? Talvez.
E só os próximos dias, horas ou instantes
Vão nos dizer se julgamos certo.
Acontece de nos termos enganado em certos pontos
E quantas vezes não bendizemos isso!
Claro que ninguém gosta de estar enganado.
Mas quando descobrimos um palhacinho
Por detrás de uma pessoa séria e reservada
É maravilhoso saber que pudemos nos enganar.
Se todos os enganos fossem assim abençoados!...
A sensibilidade do outro nos toca.
Dá até vontade de chorar.
Não sabemos direito o porquê
De nos sentirmos próximos de alguém assim tão longe,
Tão diferente e tão igual.
Mas amizade, como o amor, não se questiona.
Vive-se. Dela e pra ela.
É preciso dar tempo ao tempo
Para se saber cativar e ser cativado.
Quando saímos às pressas sempre temos o risco
De deixar alguma coisa esquecida.
Mas se tomamos o tempo de olhar bem,
Refletir, conversar, conversar e conversar...
E rir e brincar e ficarem silêncio!...
Se deixamos que essa flor nasça
Cuidadosa e docemente... aos poucos
Ela vai vendo a luz do dia. Maravilhando-se.
Contemplando o outro com novos olhos,
Ou nova maneira de olhar.
Tudo vira encanto!
Que o outro ria de mim ou pra mim, mas que ria!
Gargalhe, faça festa!...
Que eu seja, nem que seja por um pouco,
Responsável por esse rosto iluminado,
Por essa vontade de viver e de ver o virá depois.
Bendita seja essa gestação amiga!
Sem prazo, sem tempo, sem hora marcada!
Bendita seja essa amizade,
Prova de que Deus se faz conhecer através das pessoas
Que alcançam nosso coração..."
(Letícia Thompson).

EU JÁ SENTIA SAUDADES...

"Antes mesmo de te conhecer,
Eu já sentia saudades de você...
Mesmo sem nunca ter te visto.
Eu já sentia saudades, já te imaginava assim:
Terno, doce e com um carinho muito grande por mim...
Sim, eu já imaginava você...
Era como se eu já esperasse a tua chegada na minha vida.
Podia até adivinhar como seria te encontrar,
Pois eu já sentia muitas saudades de você...
Um você que demorou a chegar,
Um você que me fez tanta falta,
Um você que se escondeu durante tanto tempo
para só agora aparecer e mudar tudo.
Em segredo me encantar,
Me trazer de volta uma felicidade
Que eu havia desistido de sentir...
Me trazer essa paz que está me fazendo tanto bem!
Eu já sentia saudades desse sentimento,
Essa estranha alegria que está em mim
Ao lembrar de você...
Para mim é como se tudo isso já tivesse acontecido.
Cada gesto seu, eu já conhecia;
Cada olhar que me lança, eu já havia esperado.
Eu sabia que o nosso primeiro momento seria como foi:
Único, sereno, natural, mágico...
E agora que te encontrei,
Sinto que você é muito mais do que eu imaginava.
É muito melhor.
E eu sabia que seria assim:
Uma calmaria dentro do meu coração
E ao mesmo tempo
Uma enorme chama que queima..."
(autor desconhecido).

UM PEDAÇO DE VOCÊ...

"Um pedaço de você já ficou no tempo,
Quando você deixou de ler um bom livro,
Quando não acreditou naquele amigo...
Quando não aproveitou aquele instante para falar de amor,
Quando não abraçou seu pai e nem beijou a mãe.
Um pedaço de você se perdeu na curva,
Quando abandonou o seu sonho sem tentar,
Quando aceitou trabalhar onde não gostava,
Quando fazia o que não suportava...
Quando disse sim, quando queria dizer não,
Quando deixou o amor morrer
Antes de nascer, por medo de sofrer...
Um pedaço de você ficou parado,
Quando você não quis fazer um novo percurso,
Quando se conformou com o velho,
Quando ficou parado vendo o povo correr...
Quando votou em branco, se podia escolher,
Quando não apareceu quando era esperado.
A vida pede atitude em cada instante,
E passa por cima de quem se cala,
De quem aceita, de quem acredita
que tudo está irremediavelmente perdido...
A vida desacata quem não aceita,
Humilha quem não se valoriza,
Ensina com amor os que amam sem medidas,
Ensina com dor, os que fogem das lições.
Um pedaço de você quer tudo, outro quer se esconder.
Assim, cabe a você, só a você,
Dosar ansiedade e apatia,
Ter um tempo para criar e outro para executar...
Falar e ouvir, ensinar e aprender, caminhar e correr...
Amar e ser amado, falar baixo e gritar,
Ter um tempo para refletir...
Só não vale cruzar os braços!
Só não vale não ser você!
Só não vale esquecer:
Que nada é mais importante que você..."
(Paulo Roberto Gaefke).

ME ENCANTE...

"Me encante da maneira que você quiser,
Como você souber...
Me encante, para que eu possa me dar.
Me encante nos mínimos detalhes.
Saiba me sorrir, aquele sorriso malicioso e gostoso,
Inocente e carente...
Me encante com suas mãos, gesticule quando for preciso,
Me toque, quero correr esse risco...
Acarinhe-me se quiser, vou fingir que não entendo,
Que nem queria esse momento...
Me encante com seus olhos, me olhe profundo,
Mas só por um segundo, depois desvie o seu olhar,
Como se o meu olhar, não tivesse conseguido lhe encantar...
E então, volte a me fitar, tão profundamente,
Que eu fique perdida sem saber o que falar...
Me encante com suas palavras, fale-me dos seus sonhos,
Dos seus prazeres, me conte segredos, sem medos...
E depois me diga o quanto eu o encantei.
Me encante com serenidade, mas não se esqueça,
Também tem que ser com simplicidade,
Não pode haver maldade...
Me encante com uma certa calma, não tenha pressa,
Tente entender a minha alma...
Me encante como você fez com a primeira namorada,
Sem subterfúgios, sem cálculos,
sem dúvidas, com certezas...
Me encante na calada da madrugada,
Na luz do sol ou embaixo da chuva...
Me encante sem dizer nada ou até dizendo tudo,
Sorrindo ou chorando, triste ou alegre...
Mas me encante de verdade, com vontade...
Que depois, eu te confesso que me apaixonei
E prometo lhe encantar todos os dias,
Do resto das nossas vidas..."
(Silvana Duboc)

ÍMPETO...

"O ímpeto de crescer e viver intensamente,
Foi tão forte em mim, que não consegui resistir a ele.
Enfrentei meus sentimentos.
A vida não é racional!
É louca e cheia de mágoa.
Mas não quero viver comigo mesma.
Quero paixão, prazer, barulho, bebedeira, e todo o mal.
Quero ouvir música rouca, ver rostos, roçar em corpos,
Beber um Benedictine ardente.
Quero conhecer pessoas perversas, ser íntima delas.
Quero morder a vida, e ser despedaçada por ela.
Eu estava esperando.
Esta é a hora da expansão, do viver verdadeiro.
Todo o resto foi uma preparação.
A verdade é que sou inconstante,
Com estímulos sensuais em muitas direções.
Fiquei docemente adormecida por alguns séculos,
E entrei em erupção sem avisar..."
(Anais Nin)

ELA... (She...)

"Ela pode ser o rosto que eu não consigo esquecer
O caminho para o prazer ou para o desgosto
Pode ser meu tesouro ou o preço que eu tenho que pagar
Ela pode ser a música de verão
Pode ser o frio que o outono traz
Pode ser cem coisas diferentes
Em um dia
Ela pode ser a bela ou a fera
Pode ser a fome ou a abundância
Pode transformar cada dia em um paraíso
ou em um inferno
Ela pode ser o espelho de todos os meus sonhos
Um sorriso refletido em um rio
Ela pode não ser o que ela parece
Dentro da sua concha
Ela, que sempre parece tão feliz no meio da multidão.
Cujos olhos parecem tão secretos e tão orgulhosos
Ninguém pode vê-los quando eles choram
Ela pode ser o amor, que não espera que dure.
Pode vir a mim das sombras do passado.
Que eu irei me lembrar até o dia de minha morte
Ela pode ser a razão pela qual eu vivo
O porquê e pelo que eu estou vivendo
A pessoa que cuidarei nos tempos e nas horas mais difíceis
Eu irei levar as risadas e as lágrimas dela
E farei delas todas as minhas lembranças
Para onde ela for, eu tenho que estar lá
O sentido da minha vida é ela..."
(Charles Aznavour)

TALVEZ...

"Talvez não haja razão nenhuma
e toda eu seja demência, ou urgência, não sei...
Talvez não sejas tu, nem seja eu,
nem tenhamos nós que existir.
Talvez devesse simplesmente deixar fugir o momento,
em que dentro de ti navego e sonho e acordo a rir.
Talvez tu não sejas mais do que tudo aquilo
que a minha imaginação quis criar...
E não sejas bom nem mau, não sejas forte nem fraco,
não tenhas por dentro tanto além daquilo
que eu vejo por fora -e que, aqui entre nós, é pouco...-
Talvez a razão não me acompanhe nesta viagem
e eu percorra a estrada apenas como um louco,
sem pequenas questões nem grandes respostas.
E então, poderão perguntar-me:
- Mas afinal, porque gostas?
Talvez eu nesse instante possa responder
que é justamente esse não sei quê,
que nasce não sei quando,
vem não sei como e dói não sei porquê
que me faz acreditar..."
(Luís Vaz de Camões)

NO LIVRO DA TUA PELE...

"Leio o amor no livro da tua pele;
demoro-me em cada sílaba,
no sulco macio das vogais,
num breve obstáculo de consoantes,
em que os meus dedos penetram,
até chegarem ao fundo dos sentidos.
Desfolho as páginas que o teu desejo me abre,
ouvindo o murmúrio de um roçar de palavras
que se juntam, como corpos,
no abraço de cada frase.
E chego ao fim para voltar ao princípio,
decorando o que já sei,
e é sempre novo
quando o leio na tua pele..."
(Nuno Júdice)

A NOSSA CASA

"A nossa casa, Amor, a nossa casa!
Onde está ela, Amor, que não a vejo?
Na minha doida fantasia em brasa
Constrói-a, num instante, o meu desejo!

Onde está ela, Amor, a nossa casa,
O bem que neste mundo mais invejo?
O bando ninho aonde o nossa beijo
Será mais puro e doce que uma asa?

Sonho… que eu e tu, dois pobrezinhos,
Andamos de mãos dadas, nos caminhos
Duma terra de rosas, num jardim,

Num país de ilusão que nunca vi…
E que eu moro – tão bom! – dentro de ti
E tu, ó meu Amor, dentro de mim…"
(Florbela Espanca)

CRUCIFIÇÃO

"O que ofereces não chega.
Tua vontade tem o teu tamanho
e o corpo que lhe dás é o teu corpo
meu corpo anterior que me usurpaste.
Nem o reino que anuncias
pode abrir-se para ti
mais que os lábios rasgados do meu sexo.
Um parto é sem regresso.
E é já dos outros a fé que rege o mundo
e que os teus braços breves esticou
num abraço maior do que podias.
Não o teu verbo mas o teu corpo
eu quero que nele se transformou o meu poder.
Morre sozinho se não crês em ti.
Meu ventre bifurcando lembra ainda
a forma imaculada do teu crânio..."
(Helder Macedo)

OUTROS RESÍDUOS

"Fica um par de brincos em cima da cômoda.
Fica um elástico solto como retrato, na gaveta.
Fica a marca da cabeça deitada no travesseiro
(às vezes um fio de cabelo
para restituí-la em silêncio).
Fica a lua -a meia-lua-
que banal comparei ao seu sorriso (lembra?).
Fica você que caminha.
Seu corpo indeciso muda
e mudo se desmembra..."
(Heitor Ferraz)

QUEM SOU?

"Não sou só o que sinto
Nem o que faço ativo
Além de minhas verdades
Sou o que também minto.
Verdade é o que vivo.
Para onde vou?
Vou para um lugar encantado
Sem sofrimentos sem baixarias
Vou para onde nem sei onde fica
Espero que seja a utopia
Tipo do lugar que não terei consciência
Daquilo que me fira, me pica.
De onde vim?
Vim daquele território que não tem nome
Nem codinome nem definição
Vim do éter, do nada, do indefinível
Sou assim, por isso, o sem nome,
Qualquer nome possível, anátema ou admirável,
O impossível e o viável
Se houvera na origem um deus
No momento há eu.
Olhem meu corpo
Olhem meu corpo e pensem:
Quantos espaços alcançam meus braços?
Quantos metros andam minhas pernas?
Talvez aí estejam meus limites
Talvez aí estejam minhas finitudes
Bem se falam de altitudes e latitudes
Estes chegares da ciência e do avanço,
Eu estou no lugar que posso,
Eu estou no lugar que alcanço..."
(Ulisses Tavares)

CANÇÃO DO ADOLESCENTE

"Se mais bem olhardes
notareis que as rugas
umas são postiças outras literárias.
Notareis ainda o que mais escondo:
a descontinuidade do meu corpo híbrido.
Quando corto a rua para me ocultar
as mulheres riem -sempre tão agudas!-
do meu pobre corpo...
Que força macabra misturou pedaços
de criança e homem para me criar?
Se quereis salvar-me desta anatomia,
batizai-me depressa com as inefáveis
as assustadoras águas do mundo..."
(José Paulo Paes)

ALTERIDADE...

"Quem é esse ser que me habita
Que por mim fala e em mim cala
Quem é este estranho ser
Que vive em mim entre ter e haver
Que em mim se esconde
Que por mim responde
Que se perfaz em devaneios
Sempre aqui, acolá ou de permeio.
Que mais existe quanto mais anseio
Que sofre em mim quando amo
Que se alegra quando sofro
Que procura tecer sua trama
Nesse drama em que sou
Quem é este ser que me habita
Que me desdiz sem me dizer
Que se desfaz no meu fazer
Que grita em minha garganta
Que quanto menor mais se agiganta
Quem este poema escreve?
Sou eu mesmo ou um outro ser em mim?"
(Alberto Beuttenmuller)

O POEMA

"Um poema cresce inseguramente na confusão da carne.
Sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue ou sombra de sangue pelos canais do ser.
Fora existe o mundo.
Fora, a esplêndida violência ou os bagos de uva
onde nascem as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio -a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.
E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único, invade as órbitas,
a face amorfa das paredes, e a miséria dos minutos,
e a força sustida das coisas,
e a redonda e livre harmonia do mundo.
-Em baixo, o instrumento perplexo
ignora a espinha do mistério...
-E o poema faz-se contra o temo e a carne..."
(Herberto Helder)

MAR MORTO

"A noite caiu sobre o cais, sobre o mar, sobre mim...
As ondas fracas, contra o molhe, são vozes calmas de afogados.
O luar marca uma estrada clara e macia nas águas,
mas os barcos que saem podem procurar mais noite,
e com as suas luzes vão pôr mais estrelas além ...
O vento foi para outros cais levar o medo,
e as mulheres, que vêm dizer adeus e cantar,
hoje sabem canções com mais esperança,
canções mais fortes que a ressaca,
canções sem pausas onde passe uma sombra da morte...
Velhos marítimos -a terra é já a sua terra-
olham o mar mais distante e têm maior saudade...
Pára o rumor duns remos...
Não vão mais às estrelas as canções com noite, amor e morte...
Penso em todos os que foram e andam no mar,
em todos os que ficam e andam no mar também ...
E a luz do farol, lá longe, diz talvez..."
(Alberto de Serpa)

UMA RASTEIRA DO AMOR...

"Armadilhas armam-nas a mente,
que nos confunde e escraviza
na teia de ilusões em que nos envolve.
Coração é guardião de nossos sentimentos legítimos,
e neles está a nossa verdade.
Sentimentos pulsam involuntariamente:
sístole, diástole... bem-me-quer, mal-me-quer...
quero, devo..desejo, desdenho...vítima, algoz.
O amor verdadeiro confere coragem e é convicto:
por ele desnudam-se o corpo e a alma
e mergulha-se até o fundo do abismo sem medo do perigo.
O que importam a solidão, o frio, o silêncio,
quando busco o meu bem-amado?
Ao inferno desceria, sem pestanejar, se lá ele estivesse.
Não choro por amor -choro por covardia.
Não choro pelo que não consegui -choro pelo que não tentei.
Não construo castelos, porque são frágeis
-cavo poços, de onde brote água limpa
para me aplacar a sede da verdade.
Sentimentos são potentes
-nem todos os objetos deles são confiáveis...
Ao beija-flor, não importa que roubem suas flores
-basta que lhe poupem o bico.
O mundo é um vasto jardim cheio de flores
e o beija-flor inteligente poupa-se das que têm espinhos...
Lembre-se, meu amigo: se o galho quebra
ou é porque o macaco está muito gordo
ou porque pensa que é uma borboleta...
em ambos os casos, a responsabilidade e a ilusão são dele.
Se queres preservar teu coração do sofrimento
não o deixa exposto, à beira do rio, ao alcance de qualquer um..
E, quando tiveres coragem,
pergunta-te o que realmente queres de ti mesmo
e busca dentro dele a tua resposta mais sincera.
Só que, então, não te iludirás mais,
E não mais poderás esconder-t ede ti mesmo
sob as asas da emoção...
Porque a Mente mente, mas o coração, não!."
(Denise Rangel)

SOBRE COMO ELE PENSA QUE É...

"Um menino, de pés descalços, sentado à beira do rio,
coloca na água uma folha seca e adormece olhando o vazio.
Em seus sonhos, navega além-mar, comandando um grande navio.
Enfrenta as águas revoltas, às vezes, as calmarias
e vai assim aprendendo que todas as fantasias
têm contraponto na chuva, no vento e na poesia.
Chegando em terras longínquas, espanta-se com prodígios:
dragões que cuspiam fogo, mendigos de mãos vazias
que apesar do frio e da fome, ainda sorriam...
Seus olhinhos assustados não podiam crer no que viam:
mulheres barbadas, anões, prostitutas, bugios, em danças burlescas,
mentiam que eram felizes em meio àquela orgia.
Montou um cavalo alado e fugiu apavorado,
pois nada daquilo era compreensível
para um simples menino de beira de rio.
Doíam seus pés descalços,
pisando as folhas secas espalhadas no caminho.
Dormiu ao relento, sob estrelas de néon,
comeu o pão que o diabo amassou,
chorou de medo, colecionou conchinhas,
falou com desconhecidos que cuspiram sobre ele “verdades e sabedorias”.
Confuso, seguiu seu caminho.
Fez e perdeu amigos, cantou e vestiu fantasias,
berrou em prol de anistia, tentou entender de música,
dançou no meio da praça, agarrado a uma vadia,
provou do Bem e do Mal, só pra ver se entendia.
Parou na frente da igreja e ouviu uma ladainha,
mas o Deus não se fez visível e ele se foi, então,
em busca de novo destino...
Muitos anos se passaram nesse passeio onírico,
muitos em pesadelos horríveis,
outros, um pouco mais pacíficos
e mesmo assim ele não desistia.
Amou, foi e não foi amado, enlouqueceu de alegria,
curou-se com água fria.
Um homem, de largas sandálias, caminha pelas ruas do Rio.
Varrendo as folhas secas para debaixo do tapete, falando poesia...
O som do sino da igreja lembra o Deus não revelado
e ele pisa as conchinhas espalhadas na areia.
Do cavalo alado, restaram as rédeas, vazias.
Onde deixou seu navio?
Quando o vento sopra, ele muda e cria seus personagens
que dançam danças burlescas, cavalga amores fantasmas,
apaixona-se por si mesmo e ri de tanto chorar...
Procura quem se disponha a segui-lo sem sapatos,
no longo caminho de volta dessa sua alma vadia
ao ponto na beira do rio que liberte sua inocente poesia
escrita em folhas verdes brotadas ao som de sinos,
alguém que o cubra de beijos
até que abra as asas e pegue de volta o caminho
de sua sina e desperte na beira do rio.
Só pra entender que é divino, que brilha em todas as cores,
que o que existe é o que ele cria em seus acessos de fúria
quando apenas faz o que acha que deve,
limitando-se ao que pensa que pode,
chorando sem fantasia, nu, no meio da praça.
A inocência talvez ainda seja o seu maior pecado..."
(Denise Rangel)
PS: Esse poema foi feito para mim, sobre a minha história de vida.

FAÇAMOS ASSIM...

"Façamos assim: quando estiveres longe de mim,
Manda-me beijos, borboletas coloridas, alegres trinares...
Quando estivermos juntos, abraça-me: de verdade.
Abraço que me permita concordar em abraçar-te também.
Abraça meus olhos com os teus.
Então sentirei que és real e palpável.
Se não fores capaz, respeitarei de bom grado teus limites.
Dá-me um beijo na testa,
que entenderei teus temores e não te farei perguntas.
Ainda assim, serás, para mim, um amigo adorável.
E se me perguntas por que tantas ressalvas,
E eu te respondo sem hesitar:
-Quero que deixes as coisas às claras,
Quero que deixes de camuflar.
Sentimentos são livres como borboletas
-Posso deixá-las ir, ou com elas voar!
Não preciso, nem quero que te prendas
Às minhas oferendas
Pra te acarinhar...."
(Irinéa Maria Ribeiro)

PRECISAS SABER...

"Precisas saber...
Que a amizade sincera não comporta dores,
mas prazer; angústias, mas serenidade; nem decepções,
porque não vive de expectativas, mas de aceitação.
Que o amor verdadeiro é incondicional:
não estranha, não critica, não questiona.
E, quando não sabe o que fazer, silencia.
Reflete e conduz à reflexão.
Amigos são cúmplices mesmo quando discordam,
por simples questão de fidelidade.
Choram a dor do outro, riem à sua alegria,
consolam suas tristezas em abraços apertados.
Caminham de mãos dadas
apoiando-se mutuamente pelas curvas do caminho.
O amor colore a Amizade com nuances de variadas emoções:
rosa de ternura, verde de esperança, azul de paz,
amarelo de alegria, laranja de confiança, lilás de solidariedade,
vermelho de vitalidade, branco de plenitude...
Amigos olham-se nos olhos
num encontro profundo de sensibilidades.
A amizade e o amor consolidam-se na presença
e na construção da intimidade.
Na naturalidade com que buscam e oferecem colo.
Assim escrevem sua história e traçam um doce caminho,
sem dúvidas, sem percalços, sem tropeços.
Doam-se e se multiplicam.
Em gestos de afeto, em suave companhia.
A amizade e o amor fundem-se na alma, de onde se originam.
E nunca têm fim.
Assim é, se for pra valer.
Com entrega e sentimento.
Com intensidade e permanência.
Com carinho e paciência..."
(Denise Rangel)

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

NO ESPELHO DAS ÁGUAS...

"No espelho das águas,
tornam-se seus os meus olhos
e minhas, as suas mãos.
No espelho das águas,
eu amo por seu amor e você ama o amor em mim.
Colho flores para que você as cheire
e eu me embriague com seu perfume.
Tão louco o espelho das águas...
Ninfas e faunos disfarcados de peixes e sereias,
criamos sonhos coletivos para sonharmos juntos.
Tão sós em nossos pensamentos,
tão tribais no mundo onírico...
Tão adoravelmente loucos,
nossos delírios...
Que lindo e viver envolto em poesia,
nessa orgia de sentimentos inofensivos,
contagiantes, líricos...
Nesses encontros noturnos,
de amigos tão queridos,
de trocas tão inocentes,
despidos de identidade,
somos espelhos de água,
em todos, nos refletindo..."
(Denise Rangel)

NAS RUAS DA FILADÉLFIA...(Streets Of Philadelphia)

"Nas ruas da Filadélfia
Eu estava machucado e ferido
e não podia dizer o que eu sentia.
Eu estava irreconhecível pra mim mesmo.
Eu vi meu reflexo em uma janela.
Eu não conhecia minha própria face.
Oh, irmão, você vai me deixar
enfraquecendo nas ruas da Filadélfia?
Eu percorri a avenida
até que minhas pernas sentissem como pedra
Eu ouvi as vozes de amigos desaparecidos e sumidos.
À noite eu podia ouvir o sangue nas minhas veias
Tão negro e sussurrante como a chuva
nas ruas da Filadélfia...
Nenhum anjo vai me saudar
É apenas você e eu, meu amigo...
E minhas roupas não me cabem mais
Eu andei mil milhas só para escapar da minha pele.
A noite caiu, eu estou deitado acordado
Eu posso me ver desaparecendo
Então me receba, meu irmão, com seu beijo sem destino
ou nós vamos deixar um ao outro sozinhos desse jeito
nas ruas da Filadélfia..."
(Bruce Springsteen)

terça-feira, 27 de outubro de 2009

A PRIMAVERA CHEGA...

"A primavera chegará,
mesmo que ninguém mais saiba seu nome,
nem acredite no calendário,
nem possua jardim para recebê-la.
A inclinação do sol vai marcando outras sombras;
e os habitantes da mata,
essas criaturas naturais que ainda circulam pelo ar e pelo chão,
começam a preparar sua vida para a primavera que chega.
Finos clarins que não ouvimos devem soar por dentro da terra.
Mas é certo que a primavera chega.
É certo que a vida não se esquece,
e a terra maternalmente se enfeita
para as festas da sua perpetuação.
Algum dia, talvez, nada mais vai ser assim.
Algum dia, talvez, os homens terão a primavera que desejarem,
no momento que quiserem, independentes deste ritmo,
desta ordem, deste movimento do céu.
E os pássaros serão outros, com outros cantos e outros hábitos,
- e os ouvidos que por acaso os ouvirem
não terão nada mais com tudo aquilo
que outrora se entendeu e amou.
Enquanto há primavera, esta primavera natural,
prestemos atenção ao sussurro dos passarinhos novos,
que dão beijinhos para o ar azul.
Escutemos estas vozes que andam nas árvores,
caminhemos por estas estradas
que ainda conservam seus sentimentos antigos...
Tudo isto para brilhar um instante, apenas,
para ser lançado ao vento,
- por fidelidade à obscura semente,
ao que vem, na rotação da eternidade.
Saudemos a primavera,
dona da vida -e efêmera..."
(Cecília Meireles)

UMA DECLARAÇÃO DE AMOR...

"Uma declaração de amor
não é um acontecimento do domínio público,
uma baleia que vara na praia
sob o sol dos desastres e convoca multidões,
desalinhando hábitos quotidianos.
Uma declaração de amor
é um ato de grande intimidade
que ergue um véu transparente
de onde brotam mel e pássaros azuis.
As palavras diretas ou indiretas, ditas ou escritas,
suscitam a carícia única, irrepetível,
a leve percussão que desenha no silêncio
a imagem do que se ama.
E assim terá de se guardar.
Num lugar seguro onde os sismos
não possam encontrar o mapa do tesouro..."
(Egito Gonçalves)

A PALAVRA NO ESPAÇO

"Não sei se respondo ou se pergunto.
Sou uma voz que nasceu na penumbra do vazio.
Estou um pouco ébria e estou crescendo numa pedra.
Não tenho a sabedoria do mel ou a do vinho.
De súbito, ergo-me como uma torre de sombra fulgurante.
A minha tristeza é a da sede e a da chama.
Com esta pequena centelha quero incendiar o silêncio.
O que eu amo não sei.
Amo. Amo em total abandono.
Sinto a minha boca dentro das árvores e de uma oculta nascente.
Indecisa e ardente, algo ainda não é flor em mim.
Não estou perdida, estou entre o vento e o olvido.
Quero conhecer a minha nudez e ser o azul da presença.
Não sou a destruição cega nem a esperança impossível.
Sou alguém que espera ser aberto por uma palavra..."
(António Ramos Rosa)

COMO GOSTO DE TI...

"Em quem pensar, agora, senão em ti?
Tu, que me esvaziaste de coisas incertas,
e trouxeste amanhã da minha noite.
É verdade que te podia dizer:
"Como é mais fácil deixar que as coisas não mudem,
sermos o que sempre fomos,
mudarmos apenas dentro de nós próprios?"
Mas ensinaste-me a sermos dois;
e a ser contigo aquilo que sou,
sermos um apenas no amor que nos une,
contra a solidão que nos divide.
Mas é isto o amor:
ver-te mesmo quando te não vejo,
ouvir a tua voz que abre as fontes de todos os rios,
mesmo esse que mal corria
quando por ele passámos,
subindo a margem em que descobri
o sentido de irmos contra o tempo,
para ganhar o tempo que o tempo nos rouba.
Como gosto, meu amor, de chegar
antes de ti para te ver chegar:
com a surpresa dos teus cabelos,
e o teu rosto de água fresca que eu bebo,
com esta sede que não passa.
Tu: a primavera luminosa da minha expectativa,
a mais certa certeza de que gosto de ti,
como gostas de mim,
até ao fundo do mundo que me deste..."
(Nuno Júdice)

PESSOAS RARAS...

"Existem pessoas raras,
Difíceis de se encontrar.
Elas são lindas por fora,
Mas principalmente,
São lindas por dentro
Pois são feitas de carinho
E recheadas de verdade.
Costumam chegar de mansinho
E te conquistam dia a dia...
Elas não têm medo de competição,
Valorizam suas qualidades.
Querem te ver crescer,
Querem te ver feliz,
Querem te ver sorrir
E estão sempre perto...
Não te deixam só
Mesmo quando você não percebe,
Estão cuidando de você.
Porque são anjos desfarçados de amigos..."

O TAMANHO DAS PESSOAS...

"Uma decepção pode diminuir
o tamanho de um amor que parecia ser grande.
Uma ausência pode aumentar
o tamanho de um amor que parecia ser ínfimo.
É difícil conviver com esta elasticidade:
As pessoas se agigantam
e se encolhem aos nossos olhos.
Nosso julgamento é feito
não através de centímetros e metros,
mas de ações e reações,
de expectativas e frustrações.
Não é a altura, nem o peso, nem os músculos
que tornam uma pessoa grande.
É a sua sensibilidade, sem tamanho!"

VIVER É MÁGICO!

"Viver é mágico!
Da cartola do coração tudo pode surgir:
do lenço colorido que transforma pranto em riso
até a esperança, que surge depois que tudo mais acaba.
Redefinir as metas e ajustar o passo
dão novo sentido à vida.
Parar um pouco reanima o caminhar.
O importante é seguir sempre,
pra onde ela nos levar.
Contentar-se em si mesmo
e dar-se sempre outra chance.
De errar, corrigir, pecar, perdoar.
Acreditar que tudo é possível para quem crê que é.
Basta serenar a mente, aquietar a emoção,
respeitar o corpo e seguir o coração..."
(Denise Rangel)

QUERO VIVER MEUS DIAS...

"Quero viver meus dias, um de cada vez.
E, em cada um, poder brincar, sapeca como criança,
mantendo um entusiasmo adolescente em tudo o que fizer
e, com a sensatez que a maturidade me confere,
ter muito prazer e, de preferência, nenhuma dor.
Quero poder envelhecer naturalmente,
com os olhos brilhando, o corpo bem cuidado
a mente tranqüila e o coração sempre enamorado da vida,
para que ela, quando me abandone o corpo,
deixe em meu rosto uma expressão de paz
e um sorriso sereno de quem bem viveu e foi feliz..."
(Denise Rangel)

MINHA ALMA BRILHA...

"Eu tenho uma alma que brilha
e emana felicidade de viver.
Uma alma que já teve marcas profundas,
mas as cicatrizes não as deixam ver.
Minha alma é guerreira:
Não desiste perante o difícil.
Ela briga, ousa, bate, xinga!
Sobe paredes de precipício.
Ela chora, mas não lamenta.
Ela ama e compartilha.
É uma alma adulta, experiente, voraz...
Ao mesmo tempo menina.
Ela enxerga através dos sentimentos.
E por isso sofre quando ama.
Ela se ilude, se arrisca, se expõe,
mas não se engana...
Ah...alma perdida a minha!
Por tantos corpos que já viveu.
Corpos que já se foram,
alma que nunca morreu..."

EU ACREDITO!

"Dizem que a esperança é verde,
como as folhas pequeninas
que brotam na ponta dos galhos.
Acariciada pela brisa leve da manhã ,
e aquecida pelos raios suaves do sol,
como os brotos, a esperança se aquece
no calor dos abraços amigos
e se assegura na certeza dos sentimentos puros
que nascem da verdadeira compreensão.
Viver é pura emoção.
É construir com sorrisos a paz entre todos
e alimentar com amor o equilíbrio e a harmonia.
Acredito na vida que se veste de sol e de lua,
seja noite ou dia, com radiantes estrelas.
Que brilham nos olhos dos amigos,
dos amados e dos amantes.
Que nos fazem brotos,
que alimentam e renovam emoções,
que nos acarinham e enchem de alegria.
Eu acredito!"
(Denise Rangel)

GENTILEZA...

"A gentileza é a simpatia em movimento.
Em cada gesto, em cada ação,
ela está sempre imersa na bondade.
Aquele que é gentil aplaude o progresso dos outros
como se fosse seu próprio progresso.
Esses sentimentos de bons votos
criam um terreno fértil
para fazer prosperar o melhor para todos.
É por isso que os gentis não sabem o que são inimigos.
Ser gentil significa iluminar o rosto triste de alguém
com os ingredientes da esperança e da coragem,
como uma lanterna que ilumina o caminho
em noite escura de inverno..."
(Brahma Kumaris)

MUDE!

"Mude, mas comece devagar,
Porque a direção é mais importante que a velocidade.
Não faça do hábito um estilo de vida.
Ame a novidade, durma mais tarde, durma mais cedo.
Tente o novo todo dia: O novo lado, o novo método,
O novo sabor, o novo jeito, o novo sorriso,
O novo prazer, o novo amor, a nova vida.
Experimente coisas novas,
Troque novamente, mude de novo.
Experimente outra vez.
Você, certamente, conhecerá coisas melhores
E coisas piores do que as já conhecidas,
Mas não é isso o que importa.
O mais importante é a mudança,
O movimento, o dinamismo, a energia.
Repito por pura alegria de viver:
A salvação é pelo risco,
Sem o qual a vida não vale a pena!
Mude!"
(Clarice Lispector)

SEGUE O TEU DESTINO...

"Segue o teu destino, rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra de árvores alheias.
A realidade sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre iguais a nós próprios.
Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras como ex-voto aos deuses.
Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode dizer-te.
A resposta está além dos deuses.
Mas serenamente imita o Olimpo no teu coração.
Os deuses são deuses por que não se pensam..."
(Fernando Pessoa)

AMIGOS SÃO COMO MÚSICAS...

"Amigos são como músicas, você já percebeu?
Eles entram na vida da gente e deixam sinais.
Como a sonoridade do vento ao final da tarde.
Como os ataques de guitarras e metais
presentes em cada clarão da manhã.
Amigo é a pessoa que está ao seu lado
e você vai descobrir, olhando no disco do olhar.
Procure escutar:
Amigos foram compostos para serem ouvidos,
sentidos, compreendidos, interpretados.
Para tocarem nossas vidas com a mesma força
do instante em que foram criadas,
para tocarem suas próprias vidas
com toda essa magia de serem músicas.
E de poderem alçar todos os vôos,
de poderem cumprir todas as notas,
de poderem cumprir, afinal, o sentido
que a eles foi dado pelo compositor.
Amigo têm que fazer sucesso...
Mesmo que não estejam nas paradas;
Mesmo que não toquem no rádio..."
(Irinéa Maria Ribeiro)

O VERDADEIRO CICLO DA VIDA...

"A coisa mais injusta sobre a vida
é a maneira como ela termina.
Eu acho que o verdadeiro ciclo da vida
está todo de trás pra frente.
Nós deveríamos morrer primeiro,
nos livrar logo disso.
Daí viver num asilo até ser chutado pra fora de lá
por estar muito novo.
Ganhar um relógio de ouro e ir trabalhar.
Então você trabalha 40 anos até ficar novo o bastante
pra poder aproveitar sua aposentadoria.
Aí você curte tudo, bebe bastante álcool,
faz festas e se prepara pra faculdade.
Você vai pro colégio, tem várias namoradas,
vira criança, não tem nenhuma responsabilidade,
se torna um bebezinho de colo,
volta pro útero da mãe
e passa seus últimos nove meses de vida flutuando...
E termina tudo com um ótimo orgasmo!!!
Não seria perfeito?"
(Charles Chaplin)

QUERO TUDO E QUERO AGORA...

"Tudo tem seu tempo certo.
É o que eu costumo repetir para mim mesma,
numa tentativa tola de driblar minha ansiedade.
Mesmo que eu acredite piamente que
em nada tentar adianta antecipar fatos ou situações,
sempre me pego imaginando o futuro,
pensando como seria ou será ...
Não se trata apenas de criar expectativas.
É mais do que isso.
É desejar de verdade.
Eu quero tudo e quero agora.
Para mim não basta viver
um fim de semana memorável,
preciso emendá-lo numa segunda-feira empolgante
e seguir a semana em ritmo acelerado.
Quero viver cada momento
com todas as letras maiúsculas.
Quero negrito, sublinhado, neon e nada de reticências.
Sobra vontade, mas falta energia. ...
Ao mesmo tempo em que quero estar no ápice,
preciso do meu sossego...
Quero um equilíbrio com doses de altos e baixos,
uma montanha russa que me perturbe por dentro,
mas que também aquiete a minha alma..."
(Márcia Duarte)

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

O HAVER

"Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
-Perdoai! eles não têm culpa de ter nascido...
Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo,
Essa mão que tateia antes de ter,
Esse medo de ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo que existe.
Resta essa imobilidade, essa economia de gestos,
Essa inércia cada vez maior diante do infinito
Essa gagueira infantil de quem quer exprimir o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.
Resta essa comunhão com os sons,
Esse sentimento da matéria em repouso,
Essa angústia da simultaneidade do tempo,
Essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.
Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas,
Essa tristeza diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir passos na noite que se perdem sem história...
Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera em face da injustiça e do mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo,
Essa imensa piedade de si mesmo e de sua força inútil.
Resta esse sentimento de infância
Subitamente desentranhado de pequenos absurdos,
Essa capacidade de rir à toa,
Esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem para comprometer-se sem necessidade.
Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
E ao mesmo tempo essa vontade de servir,
Essa contemporaneidade com o amanhã
que não tiveram ontem nem hoje.
Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é,
E essa visão ampla dos acontecimentos,
E essa impressionante e desnecessária presciência,
E essa memória anterior de mundos inexistentes,
E esse heroísmo estático,
E essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.
Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem memória
Resta essa pobreza intrínseca,
Essa vaidade de não querer ser príncipe senão do seu reino.
Resta esse diálogo cotidiano com a morte,
Essa curiosidade pelo momento a vir,
Quando, apressada ela virá me entreabrir a porta
Como uma velha amante,
Mas recuará em véus ao ver-me junto à bem-amada...
Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
Esse eterno levantar-se depois de cada queda
Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
Essa terrível coragem diante do grande medo,
E esse medo infantil de ter pequenas coragens..."
(Vinicius de Moraes)

domingo, 25 de outubro de 2009

POEMA DO AMOR ARMADO

"Volto armado de amor
para trabalhar cantando
na construção da manhã.
Reparto a minha esperança
e canto a clara certeza
da vida nova que vem.
Um dia a cordilheira em fogo,
quase calou para sempre
o meu coração de companheiro.
Mas atravessei o incêndio
e continuo a cantar.
Ganhei, sofrendo, a certeza
de que o mundo não é só meu.
Mais que viver,o que importa
é trabalhar na mudança
(antes que a vida apodreça)
do que é preciso mudar.
Cada um na sua vez,
cada qual no seu lugar..."
(Thiago de Mello)

sábado, 24 de outubro de 2009

DESISTIR ?

"Desistir?
Eu já pensei seriamente nisso
mas nunca me levei realmente a sério.
É que tem mais chão nos meus olhos
do que cansaço nas minhas pernas.
Mais esperança nos meus passos
do que tristeza nos meus ombros.
Mais estradas no meu coração
do que medo na minha cabeça."

INSCRIÇÃO PARA UMA LAREIRA

"A vida é um incêndio:
nela dançamos salamandras mágicas.
Que importa restarem cinzas
se a chama foi bela e alta?
Em meio aos toros que desabam,
Cantemos a canção das chamas!!
Cantemos a canção da vida,
na própria luz consumida...”
(Mario Quintana)

QUERO FAZER CONTIGO...

"Quando não te doeu acostumar-te a mim,
À minha alma solitária e selvagem,
a meu nome que todos afugentam.
Tantas vezes vimos arder o luzeiro
nos beijando os olhos e sobre nossas cabeças
distorcer-se os crepúsculos em girantes abanos.
Sobre ti minhas palavras choveram carícias.
Faz tempo que amei teu corpo de nácar ensolarado.
Chego a te crer a dona do universo.
Te trarei das montanhas flores alegres, copihues,
avelãs escuras, e cestas silvestres de beijos.
Quero fazer contigo o que a primavera faz com as cerejas..."
(Pablo Neruda)

FALO DE TI...

"Falo de ti às pedras das estradas,
E ao sol que e louro como o teu olhar,
Falo ao rio, que desdobra a faiscar,
Vestidos de princesas e de fadas;
Falo às gaivotas de asas desdobradas,
Lembrando lenços brancos a acenar,
E aos mastros que apunhalam o luar
Na solidão das noites consteladas;
Digo os anseios, os sonhos, os desejos
Donde a tua alma, tonta de vitória,
Levanta ao céu a torre dos meus beijos!
E os meus gritos de amor, cruzando o espaço,
Sobre os brocados fúlgidos da glória,
São astros que me tombam do regaço!"
(Florbela Espanca)

AMORES...

"Não creio que amores se apaguem;
apenas se escondem do vento
para não perderem o fogo...
e mesmo que virem brasa,
se soprados pelos mesmos lábios de ontem,
voltarão... assim,
amores são elos de perpetuação.
podem até desaparecer,
mas nunca morrerão.
Pois, são plantados na alma
com raízes no coração!"
(Santaroza)

CONCHAS...

"Procuro amigos como quem cata conchas,
entre praias, areias e pedras escorregadias.
Não tenho pressa. Escolho. Pulo as ondas.
Deixo o tempo me entreter em suas manias.
Quando encontro, ponho logo na coleção,
aquele lugar reservado desde sempre.
Alguns dão trabalho, peças exigentes,
outros acomodam-se dóceis ao coração.
O mar as vezes me traz algas, guardo-as também.
Não sou devoto das formas convencionais.
No mais, não sou fiscal de conchas.
Que mal tem se não pergunto nem exijo credenciais?
Arrisco. Meto a mão.
Danem-se os caranguejos..."
(Rodrigo Mendes Rosa)

HOJE ME DEI CONTA

"Hoje me dei conta
de que as pessoasvivem a esperar por algo
E quando surge uma oportunidade
Se dizem confusas e despreparadas,
sentem que não merecem,
Que o tempo certo ainda não chegou,
E a vida passa e os momentos se acumulam
Como papéis sobre uma mesa.
Estamos nos preparando para qualquer coisa
Mas ainda não aprendemos a viver,
A arriscar por aquilo que queremos,
A sentir aquilo que sonhamos.
E assim adiamos nossos dias
E nossas vidas por tempo indeterminado
Até que a vida se encarregue
de decidir por nós mesmos,
E percebemos o quanto perdemos
E o tanto que poderíamos ter evitado..."
(Fenando Pessoa)

VOCÊ BEM QUE PODIA...

"...você bem que podia ter surgido na minha vida
vinte anos atrás,
quando eu ainda tinha planos.
Quinze anos atrás,
quando eu estava me formando.
Onze anos atrás,
quando eu morava sozinha.
Dez anos atrás,
quando eu ainda era solteira.
Seis anos atrás,
quando eu ainda estava tentando.
Dois meses atrás,
quando sobrava alguma força.
Ontem à noite
eu ainda estava te esperando..."
(Martha Medeiros)

SUPOSIÇÃO...

"Como é por dentro outra pessoa
Quem é que o saberá sonhar?
A alma de outrem é outro universo
Com que não há comunicação possível,
Com que não há verdadeiro entendimento.
Nada sabemos da alma
Senão da nossa;
As dos outros são olhares, são gestos,
são palavras, com a suposição
de qualquer semelhança no fundo..."
(Fernando Pessoa)

SOB A AÇÃO DO TEMPO

"Eu já senti mais saudade de você.
Houve um tempo, por exemplo,
que tudo me trazia você à lembrança.
Não sei. Mas, talvez eu esteja esquecendo
o brilho de teus olhos verdes... Azuis?
Castanhos. Acho que são castanhos.
Então... nem o mar, outrora seu retrato fiel,
nem a lua me trazem mais você à memória.
E pra falar a verdade, eu confesso:
às vezes me esqueço de alguns detalhes de nossa estória.
É. Eu já senti mais saudade de você.
Nos dias frios de inverno, creia!
sua ausência era um inferno.
Hoje, se o dia está frio acendo a lareira..."
(José Maria Alves Nunes)

O SINO DA MINHA ALDEIA...

"Ó sino da minha aldeia,
Dolente na tarde calma,
Cada tua badalada
Soa dentro da minha alma.
E é tão lento o teu soar,
Tão triste da vida,
Que já a primeira pancada
Tem o som de repetida.
Por mais que me tanjas perto
Quando passo, sempre errante,
És para mim como um sonho,
Soa-me na alma distante.
A cada pancada tua,
Vibrante no céu aberto,
Sinto mais longe o passado,
Sinto a saudade mais perto..."
(Fernando Pessoa)

NOVELO DE SONHOS

"Segura naquela estrela
enquanto eu vou buscar uma caixa pequenina
para a poder guardá-la.
Faço dela candeeiro que de noite me alumia,
assusta para longe os monstros da minha fantasia.
Segura nessa lua
que eu vou buscar a tesoura,
vou pendurá-la no meu quarto como poster de cantora.
Agarra nessa nuvem
que a quero para almofada
se for grande faço com ela uma cama enfeitada.
Desfia uma história antes de eu adormecer,
enrola o novelo dos sonhos,
fonte onde vou beber..."
(Nuno Rita)

SE AO MENOS...

"Se ao menos soubesses tudo o que eu não disse
ou se ao menos me desses as mãos como quem beija
e não partisses, assim, empurrando o vento
com o coração aflito, sufocado de segredos;
se ao menos percebesses que eram nossos
todos os bancos de todos os jardins;
Se ao menos tivesses levado as minhas mãos
para tocar os teus dedos, para guardar o teu corpo;
se ao menos tivesses quebrado o riso frio dos espelhos
onde o teu rosto se esconde no meu rosto
e a minha boca lembra a tua despedida,
talvez que, hoje, meu amor, eu pudesse esquecer
essa cor perdida nos teus olhos..."
(Joaquim pessoa)

RAZÕES...

"Pensarás que é mentira e é no entanto verdade
- mas me afasto de ti, propositadamente,
pelo estranho prazer de sentir que a saudade
ainda torna maior o coração da gente...
Parto! Bem sei que parto sem necessidade!
Quero ver os teus olhos turvos, de repente,
embora não compreenda essa felicidade
que assim te faz sofrer comigo inutilmente!
Quero ouvir-te pedir na hora da despedida
que eu volte bem depressa para a tua vida...
- quero no último beijo um soluço interior...
Que enquanto ficas só, e enquanto eu vou sozinho,
sabemos que a saudade vai tecendo o ninho
que há de aquecer na volta o nosso eterno amor!"
(J. G. de Araújo Jorge)

UMA COISA CHAMADA CONSCIÊNCIA...

"Existem coisas com as quais, definitivamente, não sei lidar.
Não sei jogar e nem me arrisco a isso, porque fatalmente perco.
Perco porque só sei usar as regras normais,
aquelas que são definidas antecipadamente
pelo que é considerado justo pela razão e pelo bom senso.
Essas regras tolas, que algumas pessoas desconhecem
ou fazem questão de ignorar.
Eu poderia aprender a burlar algumas, a manipular o jogo,
a esconder cartas na manga, blefar e enganar.
Mas tem uma coisa em mim que se chama consciência,
que tem o grave defeito de não caber no meu travesseiro,
quando me deito, se acaso faço algo que não devo.
Por isso, procuro deixar a minha consciência sempre tranquila,
perfeitamente acomodada entre o que acredito, penso e faço.
Sendo assim, não perco o sono, mas perco o jogo.
E fico assistindo, com cara de paisagem,
as pessoas empunhando a taça da vitória com uma das mãos,
escondendo atrás do corpo a outra,
cheia de truques e imoralidades.
Para estas, consciência não é problema.
Importa sim estar por cima, doa a quem doer.
Delas, penso duas coisas:
Ou a consciência delas é só aquele grilo verde das historinhas
que não serve para nada,
ou na cama delas deve haver um travesseiro enorme!"
(Helena C. de Araujo)

O QUE PENSAM DE MIM...

"Adoro avaliar o olhar de algumas pessoas sobre mim.
Percebo-lhes, pelas emoções e respostas,
os sentimentos em que me guardam.
A algumas, provoco sensações boas e percebo isso.
Porque são as mesmas sensações que provocam em mim.
A outras, sinto que tenho o dom de despertar
a mesma raiva que em mim despertam.
Só que as minhas reações
diante dessa "raiva recíproca" são diferentes.
Não fico me escondendo em meias palavras e indiretas.
O que tenho que dizer, eu digo.
Não me afundo em falsos poços e solidões.
Detesto parecer "chorosa".
E detesto quem parece.
Detesto me fazer de vítima.
E abomino quem age assim
na tentativa de angariar ombros às suas dores..."
(Helena C. de Araujo)