domingo, 15 de novembro de 2009

SALTO FALHADO

"Está na ponte e vai saltar.
Mas há alguém que grita.
E o grito ecoa pelo espaço vazio.
Os carros passam demasiado depressa.
Mesmo com velocidade controlada.
Circulam por dentro da sua indiferença contida.
Ninguém sabe quem é.
Está na ponte e vai-se atirar.
Imagina-se para onde vai.
Para um vazio qualquer.
Talvez procure outro mundo e outra vida.
Há alguém que grita.
Mas o grito perde-se no espaço vazio.
Os carros passam demasiado depressa.
Só um sorriso o poderia salvar.
Mas ela ficou em outro lugar.
Talvez espere por ele.
E ele não sabe regressar.
Alguém grita.
Ele volta-se para se agarrar.
Antes da queda final.
As pessoas regressam a casa.
Depois de mais um dia cumprido.
A noite cai devagar.
Mas ele cairá num ápice.
O dia volta amanhã.
Mas para ele não haverá regresso.
Está na ponte e vai saltar.
Há alguém que grita.
Como se o tempo ainda pudesse parar.
Os carros passam depressa.
Mesmo com velocidade controlada.
O coração bate a compasso.
O sangue ecoa nos pulsos.
O rio ficaria vermelho se agora os abrisse.
Ouve-se um grito ao longe.
Ele regressa devagar.
Há um carro da polícia que pára.
O senhor não sabe que não pode andar assim na ponte?
É que eu ia saltar.
Não me venha com desculpas e entre no carro.
A polícia leva o homem que não saltou.
Houve alguém que gritou.
E o grito dissolve-se no ar.
Já ninguém o ouve.
Há um carro que pára no mesmo lugar
de onde ele ia saltar.
Isto de ter avarias na ponte
é uma chatice e dá direito a multa.
Há um grito que ecoa no ar.
Mas este conseguimos compreender.
Anda com essa merda para frente,
minha besta!"
(J.C.P.T.)

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