terça-feira, 17 de agosto de 2010

PERMANÊNCIA

"Nāo escrevo muito sobre a morte:
na verdade ela é que escreve sobre nós
desde que nascemos vai elaborando
o roteiro de nossa vida.
Ela é a grande personagem,
o olho que nos contempla sem dormir,
a voz que nos convoca e nāo queremos ouvir,
mas pode nos revelar muitos segredos.
O maior deles talvez seja:
morte torna a vida maravilhosa.
Porque vamos morrer presisamos poder dizer hoje
que amamos, fazer hoje o que desejamos tanto,
abraçar hoje o filho ou o amigo,
temos de ser decentes hoje,
generosos hoje, felizes hoje.
A morte nāo nos persegue:
apenas espera,
pois nós é que corremos para o colo dela.
Talvez o melhor de tudo é que ela nos lembra
da nossa transcendência.
Somos mais que corpo e sangue e compromissos,
susto e ansiedade: somos mistério,
o que nos torna maiores do que pensamos ser.
E o amor,
quando se aproxima desse território do estranho,
tem de se curvar: com dor, com terror,
com enorme ansiedade dá um salto irrevogável
para essa prova maior.
E então começa a ser ternura;
e entāo se aproxima, muito vagamente,
de alguma coisa chamada permanência."
(Lya Luft)

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