quinta-feira, 29 de outubro de 2009

O POEMA

"Um poema cresce inseguramente na confusão da carne.
Sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue ou sombra de sangue pelos canais do ser.
Fora existe o mundo.
Fora, a esplêndida violência ou os bagos de uva
onde nascem as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio -a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.
E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único, invade as órbitas,
a face amorfa das paredes, e a miséria dos minutos,
e a força sustida das coisas,
e a redonda e livre harmonia do mundo.
-Em baixo, o instrumento perplexo
ignora a espinha do mistério...
-E o poema faz-se contra o temo e a carne..."
(Herberto Helder)

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