sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

TODAS AS PORTAS DA VIDA

Tira-me o pão, se quiseres, tira-me o ar,
mas não me tires o teu riso.
Não me tires a rosa, a lança que desfolhas,
a água que de súbito brota da tua alegria,
a repentina onda de prata que em ti nasce.
A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados às vezes por ver
que a terra não muda, mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas as portas da vida.
Meu amor, nos momentos mais escuros
solta o teu riso e se de súbito vires
que o meu sangue mancha as pedras da rua,
ri, porque o teu riso será para as minhas mãos
como uma espada fresca...
À beira do mar, no Outono,
teu riso deve erguer sua cascata de espuma,
e na primavera, amor, quero teu riso
como a flor que esperava, a flor azul,
a rosa da minha pátria sonora.
Ri-te da noite, do dia, da lua,
ri-te das ruas tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro rapaz que te ama,
mas quando abro os olhos e os fechos,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar, a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria..."
(Pablo Neruda)

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