terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

A MINHA SOLIDÃO

"A minha solidão não é uma invenção
para enfeitar noites estreladas…
Mas este querer arrancar
a própria sombra do chão
e ir com ela pelas ruas de mãos dadas.
Mas este sufocar entre coisas mortas
e pedras de frio
onde nem sequer há portas para o calafrio.
Mas este rir-me de repente
no poço das noites amarelas…
-única chama consciente
com boca nas estrelas.
Mas este eterno Só-Um
-mesmo quando me queima a pele o teu suor-
sem carne em comum com o mundo em redor.
Mas este haver entre mim e a vida
sempre uma sombra que me impede
de gozar na boca ressequida
o sabor da própria sede.
Mas este sonho indeciso
de querer salvar o mundo
-e descobrir afinal que não piso
o mesmo chão do pobre e do vagabundo-.
Mas este saber que tudo me repele
no vento vestido de areia…
e até, quando a toco, a própria pele
me parece alheia…
Não. A minha solidão
Não é uma invenção
Para enfeitar o céu estrelado…
Mas este deitar-me de súbito
a chorar no chão
e agarrar a terra para sentir
um corpo vivo a meu lado..."
(José Gomes Ferreira)

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