quarta-feira, 21 de outubro de 2009

TUA AUSÊNCIA NO MEU MUNDO...

"Não é que a dor me doa mais que em todos os outros dias, não.
Mas é que hoje, acintosamente,
tua ausência avançou pelo meu mundo um pouco mais,
com leves passos, tingindo de negro o que já era cinza.
Essa mesma ausência dormita em meu leito,
ocupa o espaço que é teu,
onde desejei vezes sem conta que estivesses.
Se não fosse por ela, teu peito abrigaria meu cansaço,
delimitaria meu espaço e em ti eu seria o que sequer sabia.
Quando a madrugada se apoderasse das familiares horas noturnas,
tu me aninharias qual delicada flor e, como pétalas,
minhas costas fariam um convite para que teus dedos ágeis
refizessem o caminho percorrido por teus lábios.
Eu repousaria o cansaço, os temores,
a fome em teus braços, único abrigo conhecido.
Da tua boca eu beberia de ti, do teu silêncio,
da tua fúria contida há tanto.
Tua boca me daria a saliva,
o sal, o prumo, o rumo, teu gosto e o meu.
Teus olhos atentos estariam pousados em mim,
sempre incrédulos, nunca mansos.
Neles, ninguém além de mim, veria teu brilho ambarino,
teus olhos de som e cor.
Do teu corpo eu faria um porto,
onde o meu permaneceria ancorado, saciado, repleto de ti.
Do meu ventre reverberariam
as cintilâncias da tua lua deserta e necessária.
Na minha boca entreaberta estaria o teu nome, minha prece,
o calor do teu corpo moreno de deserto,
o gosto da tua carne, a avidez que me consome.
E tudo isso ainda nos doeria...
Mas talvez assim, hoje não me doesse tanto a tua ausência,
cruel e sorrateira, tangível e indelével,
que tinge meus dias com as cores do nada..."
(Rosana Ribeiro)

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