domingo, 27 de dezembro de 2009

A VOZ

"Cada dia o silêncio do quarto isolado
se recolhe no leve marulho dos gestos
como o ar. Cada dia a estreita janela
se abre imóvel ao ar que se cala.
A voz rouca e doce
não volta no fresco silêncio.
O ar imóvel se abre ao alento
de quem vai falar e se cala.
É assim todo dia. E a voz é a mesma,
mas não rompe o silêncio, rouca e igual
como na sempre imobilidade da memória.
A clara janela acompanha
com sua breve batida o antigo sossego.
Cada gesto percute o antigo sossego.
Se soasse a voz, voltariam as dores.
Voltariam os gestos no ar espantado
e palavras, palavras à voz submissa.
Se essa voz ressoasse,
até a breve batida do silêncio que dura
seria uma dor.
Voltariam os gestos das dores inúteis,
percutindo nas coisas o estrondo do tempo.
Mas a voz não retorna, e o sussurro distante
não encrespa a memória.
Imóvel a luz relampeja serena.
E o silêncio se cala
para sempre, submisso,
na imagem antiga..."
(Cesare Pavese)

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