segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

UM RASTRO DE SILÊNCIO...

"Existe um rasto de silêncio
pelas ruas desta cidade onde moro.
O meu corpo tece horas já
e nada se apaga como antes.
Onde estou, o frio é incessante
e às minhas mãos queimam-se fotografias
como se o passado não existisse mais.
De hoje em diante, irei apagar-me em cada dia,
para que nada reste dentro de mim
ou dentro da garrafa vazia.
Por isso te vejo a desaparecer rapidamente,
como um dente-de-leão ao vento da minha voz,
ao agredir-te sem que te doa
ou marque para sempre.
E para que os dias passem,
bebo-me de dentro das mãos.
Como um vinho verde que me corre no corpo
e assim a visão do mundo é mais carente
-o frio que sinto é da cidade.
Nada mais existe por aqui
que me prenda ou que me faça ficar.
Visto a mala para pensar na partida,
carrego-me pela porta até ao jardim
que se estende lá fora,
sem luz sem sol, nem calor.
Os meus pés já não caminham porque não sabem.
Porque todas as cartas me ensinaram
que a maneira como se pisa um ladrilho
é igual à de pisar um rosto
mesmo que de tal não se goste.
Por isso perco os sentidos nesta cidade
sem polícia e sem refúgios
-como se fosse eu o último a perder-me
nas ruas labirínticas e planas
onde o vento me espalha a memória
como água em papel..."
(Sérgio Xarepe)

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